quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O pai da popularidade

Repórter Ping-Pong


Ele começou a chamar a atenção do público com apenas quatro anos. Aos sete, participou de um filme com Eliana Macedo. Aos 13, iniciou sua atividade na Rádio Piratininga, de Tupã, interior de São Paulo.

Esse é o início da carreira de Mário Motta, que de São Paulo veio a Lages para conhecer Santa Catarina, e acabou se encantando com as praias e as oportunidades que não teria no estado natal.

Formado em Educação Física, tem larga experiência em coberturas esportivas. Atuou em secretarias esportivas, e ministrou até aulas na área. Sua mais insana transmissão, foi a narração de um jogo de Beisebol pelo rádio.

Repentinamente, inventou de transmitir os Jogos Abertos de Santa Catarina. Aliou o gosto pelo esporte à aptidão pela comunicação.


Hoje, a figura é facilmente reconhecida nas ruas. Além dos anos de dedicação ao jornal do Almoço, também é normal que ele apresente cerimônias na região. Eis que num desses tantos eventos que Mário costuma apresentar, a RBS visualizou o âncora do Jornal do Almoço em 1986. Desde então, ele não saiu mais dessa atividade.

Constam em seu currículo passagens pela Rádio Clube, e Princesa de Lages, Rádio Emissora de ABC, de Santo André, e rádio CBN Diário, onde comanda o programa Notícias na Manhã. Também participou da equipe que deu início à TV Planalto (atual SBT/SC) em Lages no início da década de 1980 e mais tarde em Florianópolis.

E ao que tudo indica, passou a perna no Roberto Alves, ao firmar uma parceria entre a TV Planalto e a RBS, quando o Roberto dizia aos quatro ventos que transmitia com exclusividade os Jogos Abertos de Brusque em 1985. Danou-se!

Na televisão, no rádio e no jornal impresso. Mário aventurou-se no Jornal de Tupã e no Jornal da Alta Paulista em meados dos anos 1960 e mais tarde no Correio Lageano quando chegou à Santa Catarina. Em Florianópolis, está desde a inauguração do popular Hora de Santa Catarina no qual mantém a coluna Hora das Ruas, onde ajuda os cidadãos a tampar os buracos de rua ou também a achar um cachorrinho perdido.

Na entrevista, ele aprofunda as histórias vividas nos muitos veículos nos quais adquiriu experiência. Ele também discute a reformulação editorial do Jornal do Almoço, balançado pela concorrência e pela audiência.

Falta a Mário Motta o diploma acadêmico, mas o conhecimento de causa lhe sobra. Sua frase mais subversiva é: não dá para esperar imparcialidade do jornalismo. Você tem que cobrar isenção.

O marinho
Repórter Ping-pong - Antes de entrar no jornalismo você se considerava alguém inquieto, ansioso, enfim, se considerava alguém que pretendia mudar o mundo?
Mário Motta - Quando eu era o marinho ainda, a noção de mundo que nós tínhamos era muito restrita. Talvez ao quintal do circo dos meus pais. Confesso que nós tínhamos uma visão de mundo muito pequena, então, não era tão difícil mudá-lo. O que a garotada queria era que o quintal da casa não tivesse nenhum toco no meio do caminho, nenhuma toicera de grama que geralmente fazia com que a bola quicasse para o lado errado. Que o cachorro do vizinho ficasse sempre preso pra não correr atrás.
Ping - Que lugar era esse?
Mário Motta - Meus pais trabalhavam na rádio Bandeirantes de São Paulo. Eles tinham adquirido um circo teatro que armavam na periferia de São Paulo. A cada 10, 15 dias, trocavam de bairro. Ele fazia uso do rádio para convidar as pessoas pra irem ao circo que estava na vila Maria, no Carrão, na Mooca. Quando eu nasci, o circo estava num vilarejo chamado Prefeito Saladino, que fica do lado de Santo André. Tanto que o parto da minha mãe, foi em Santo André que, na época, era um município conurbado com São Paulo, mas com muito terrenos baldios separando de São Caetano, que era separado do Ipiranga. Nasci quando o circo estava em Santo André, por isso nasci lá, mas fui criado pelo interior de São Paulo, quando meu pai pediu demissão da rádio com a minha mãe, pegaram o circo e foram procurar um clima mais quente, para que eu pudesse me desenvolver em função de uma série de doenças que eu tive quando era pequeninho.
Ping - Pois é, pequeninho, tem uma história inusitada, diferente, digamos assim, que foi o teu primeiro passo profissional além do circo. Que história é essa de fazer um trabalho nas telonas?
Mário Motta - Na verdade, o primeiro trabalho profissional que eu fiz, foi no próprio circo, quando eu tinha quatro anos de idade, ganhei de presente uma sanfoninha. E eu comecei a tocar, a solar músicas de sucesso da época. Meu pai pegou um violão e começou a me acompanhar e percebeu que poderia me transformar em uma das atrações do circo. E isso aconteceu realmente.
Quanto à telona, uma vez um grupo do Rio de Janeiro fazendo uma excursão pelo interior de São Paulo, trazidos por um radialista famosíssimo chamado Renato Murce. Ele comandava na Rádio Nacional um famoso programa de calouros chamado Papel Carbono, onde os cantores tentariam ser os carbonos de seus ídolos. Renato Murce era um dos maiores nomes do Rádio brasileiro ao lado de Paulo Gracindo, Cesar de Alencar entre outros.

Renato Murce era casado com uma das maiores estrelas do cinema brasileiro da época, a Eliana Macedo, cujo tio, Watson Macedo, era um dos maiores diretores do cinema nacional. A Eliana era uma espécie de namoradinha do Brasil na época e estrelava os filmes nacionais mais assistidos. O Renato Murce levou um grupo para essa excursão no interior de São Paulo e coincidiu de, em Araçatuba, o grupo não ter um espetáculo naquela noite, ir ao circo do meu pai que estava em temporada na cidade. Eu participei da apresentação de uma peça, fazendo um garotinho, e o Renato Murce, depois do espetáculo, conversou com meu pai e disse que eu tinha jeito e que o tio da Eliana tinha o roteiro de um filme chamado Maria 38 que precisava de um garotinho e que ia mandar um telegrama ao meu pai, para que eu fizesse um teste para o papel.


A história de se vestir um terno e te perguntarem se você ia ligar para São Paulo, era verdadeira na época.
Naquela época, era a coisa mais difícil localizar as pessoas pelo Brasil. A história de se vestir um terno e te perguntarem se você ia ligar para São Paulo, era verdadeira na época. Meu pai achou que nunca ia acontecer de ele [Renato Murce] localizar o circo. Curiosamente, ele não só localizou, como mandou as passagens, e um telegrama dizendo: traga o marinho para fazer o teste. Tinha uma centena de crianças fazendo o teste e eu fui aprovado. Foi a minha primeira grande experiência com câmera fazendo o Maria 38. Corria o ano de 1959.
Ping – O circo te deu uma desenvoltura pra tratar com público, já muito cedo, o cinema também, foi só um filme, mas tem lá a sua relevância e, de repente, na juventude você decide fazer educação física. Por que isso?
Mário Motta - Se você parar para aprofundar, você vai perceber que há uma grande relação muito grande entre a área... não da educação física mas da acrobacia da utilização do físico com o circo. Eu, por exemplo, fazia saltos, rola-rola, equilíbrio.
Ping - É essa a ligação então?
Mário Motta - Não. Essa não é a ligação. Essa passa a ser uma ligação virtual se você quiser amarrar as coisas. O que aconteceu foi que quando eu terminei o estudo científico, meu pai vendeu o circo numa cidade chamada Tupã, e a minha intenção era fazer medicina. Mas não fiz porque não tinha faculdade de medicina próximo dali.
Ping - Que idade estavas nessa época?
Mário Motta - Estava na idade de faculdade. 16 pra 17 anos. Eu ia sair pra começar a fazer o que, na época, a gente chamava de cursinho pré-vestibular. Mas daí, fui convocado para o tiro de guerra, ou seja, o exército, tive que servir ao exército.  E no interior de São Paulo, tiro de guerra, são unidades militares do exército em que os jovens não precisam se deslocar para uma guarnição. Você pode trabalhar e estudar na sua cidade e, de manhã, 5h30min, 6h, você vai para a instrução.
No tiro de guerra, não precisei deixar meu emprego, eu já trabalhava nessa época em rádio. Quando meu pai vendeu o circo e fixou residência em Tupã para que eu completasse o científico, ele voltou a fazer um programa numa rádio local, primeiro na Rádio Clube e, depois, ele mudou para a Rádio Piratininga e eu ia com o pai à noite, era das 22h às 23h. Ele fazia um programa de saudades, chamava-se no tempo do Motinha, em que revivia a relação que ele teve com os grandes nomes da música em São Paulo, como Francisco Alves, Orlando Silva, Dalva de Oliveira. Ele fazia esse programa, na rádio, e eu comecei a ir com ele, com 13 pra 14 anos, e brincava de fazer comercial, como se fosse no circo, quando eu fazia propagandas no auto-falante do circo e, quando eu percebi, estava trabalhando em rádio, com essa idade.
Na época, era um absurdo um rapaz lecionar, arco, massa, bola e fita
Fui fazer Educação Física, porque era uma faculdade que se aproximava da área das humanas, era inclusive a primeira turma. Aí pensei em fazer a primeira fase do curso, que era muito semelhante à primeira fase de medicina. E no ano seguinte eu ia tentar de novo o vestibular para medicina. Mas eu me apaixonei pela área pedagógica e decidi terminar. Me formei nessa primeira turma e fui patrono da segunda, lecionando ginástica rítmica desportiva. Na época, era um absurdo um rapaz lecionar, arco, massa, bola e fita, disciplina essencialmente feminina. É certo que minha vivencia artística no Circo me abria a mente para perceber que a disciplina não era mais do que a soma de ritmo e coordenação e vale tanto para mulheres, como para homens.
Fui fazer educação física, porque não podia fazer medicina, e comecei em rádio justamente nessa época. Eu sempre fiz uso da comunicação ao me apresentar artisticamente no circo, ou ao interpretar, ou ao enfrentar uma plateia. E eu sempre fiz uso da educação, sempre que tive que me comunicar, informar, noticiar. Pedagogicamente, é como se a gente fosse desenvolvendo uma maneira de explicar as coisas para as pessoas, e você tanto usa isso no teatro, numa apresentação musical, numa palestra, como em qualquer outra circunstância, que te exija comunicação.
Nasce o jornalista
É necessário dizer: a imagem foi manipulada.
Ping -  Vamos para Santa Catarina, foi em Lages que você começou no Jornalismo?
Mário Motta - Eu estava muito bem em Tupã. Trabalhava na rádio e tinha uma facilidade muito grande de comunicação na cidade. Todos me conheciam não só porque trabalhava em rádio, mas porque era o marinho do circo do Motinha, que já tinha passado na cidade.
Ping - Você apresentava um programa no rádio? Fazia o quê?
Mário Motta - Eu fazia de tudo. Comecei lá com 13 pra 14 anos e era o officeboy do microfone. Na medida em que fui pegando experiência, eu passei a ter um programa de esportes, um programa musical, chamava-se MMBom.

Mas no final de 1974 resolvi vir à Santa Catarina passear e acabei conhecendo Lages. Fomos muito bem recebidos no planalto serrano e na época, a cidade de Lages tinha 120 mil habitantes, quatro emissoras de rádio e dois jornais. Quando eu soube disso, tanto eu, quanto um outro amigo que também trabalhava em rádio, pensamos: de fome aqui nós não vamos morrer. Se não conseguirmos aulas como professores, tem várias rádio aqui.
Ping – E onde foi que você começou a atuar na imprensa?
Mário Motta Aqui em Santa Catarina, comecei na Rádio Princesa. Havia conseguido aulas no Centro Educacional Vidal Ramos Jr. Como Professor e no dia seguinte também já estava empregado na Rádio Princesa pelo Carlos Henrique Marc Fiuza. Como ainda não havia muito material humano e eu já tinha uns dez anos de experiência em rádio, aliás, já tinha até o próprio Registro Profissional como Radialista do Ministério do Trabalho.
Ping - E quais foram os teus primeiros trabalhos na rádio Princesa de Lages, que era uma rádio pequena. Que jornalismo era esse?
Mário Motta - Eu comecei na área de esportes. Mas, nessa época, não era uma rádio pequena. Era uma das maiores emissoras e de maior alcance em Santa Catarina.
Ping – E qual a sua atividade nela?
Mário Motta - Repórter esportivo. O narrador era o Sandro Santos, o homem da moça branca; o Quirino Ribeiro era o comentarista realmente técnico; o Rogério Ramos era o repórter objetivo e eu era o repórter descontraído. Eram esses os nossos slogans.
Nessa época, eu também escrevia uma coluna no Correio Lageano, sobre futebol.
Trabalhei um ano na Princesa. E fui convidado a trabalhar na Rádio Clube. Com a morte do seu fundador Carlos Jofre do Amaral, seu filho Roberto Amaral deixou a Telesc onde era Engenheiro e assumiu os negócios da família. A família Amaral (que hoje mantém o SBT/SC) já tinha planos de montar uma televisão em Lages.

Ping - E na Rádio Clube, o que você fazia?
Mário Motta Fui para a Rádio Clube, nesse período, ainda para trabalhar com esportes. Depois, recebi um convite para trabalhar em Florianópolis na área pedagógica de educação física na Secretaria de Educação. Mas essa experiência acabou não dando certo e como eu já havia deixado Lages, resolvi que não retornaria para a Serra. Como alternativa, eu tinha acabado de passar em concurso para o magistério público em São Paulo e fui chamado para assumir uma vaga num colégio da rede pública como professor. E decidi voltar para São Paulo.

Meus pais já haviam retornado a Santo André. Como tinham uma casa própria por lá, entenderam melhor voltar para a capital. Quanto retornei à Santo André, já havia casado com a Glorinha (que também é de Tupã e formou-se na mesma turma que eu em Educação Física). Nesse retorno, além de me efetivar como professor de educação física num pequeno colégio em Mauá (município que faz divisa com Santo André), também acompanhei um amigo chamado Valdir Ferreira Martins e fui treinar o time Masculino de Voleibol do Clube de Regatas Tietê, na Ponte Grande em São Paulo.
Ping – Estacionou os trabalhos o jornalismo?
Mário Motta - Não. Cheguei e há um mês na cidade, assistindo alguns programas de televisão, e eu dizia, mas não é possível, esse pessoal é muito ruim, com todo o respeito! Ou melhor, eu não sou pior do que eles. Não é possível. Eu não vou ficar fora do meio, de forma alguma. Então procurei a primeira emissora que me deu na cabeça. Era a rádio Emissora ABC de Santo André, que transmitia o campeonato da divisão intermediária de São Paulo. O Santo André estava tentando subir para a divisão especial. Nesse ano, o time conseguiu o acesso, com o Sebastião Lapola de técnico.
Aí me disseram que a equipe era pequena e que não tinha salário, mas eu não estava interessado em salário, o que eu queria era não ficar fora do meio
Procurei a emissora e falei: “Sou repórter esportivo e quero trabalhar”. Aí me disseram que a equipe era pequena e que não tinha salário fixo, etc. Eu não estava interessado em salário, o que eu queria era não ficar fora do meio. Aí me deixaram fazer um teste. O Santo André tinha um amistoso em Rio Claro e eu fui como repórter. Mas o comentarista titular da equipe não chegou a tempo para a jornada e me pediram para “quebrar o galho”. Naquela época, eu já estava fazendo o Curso Técnico de Futebol e além do conhecimento técnico e tático, tinha também o linguajar muito mais adequado. O intervalo do jogo naquela época não era como hoje em que as emissoras preparam uma série de participações. Naquela época o comentarista segurava sozinho os 20 minutos de intervalo. Quando terminei o comentário, o narrador me perguntou se eu achava que era melhor repórter do que comentarista. Respondi que sim e ele me disse: “Desculpe-me, mas não acho que seja possível. E você vai ser nosso Comentarista Ponto final. No fim, passei a ser comentarista da Rádio Emissora ABC e assim não me afastei da área esportiva e da Comunicação, que tanto amava.

Permaneci um ano em Santo André, quando o pessoal da rádio Piratininga, onde eu havia começado lá no interior, me convidou para voltar à terra e assumir a direção artística da emissora, era uma espécie de gerente da rádio. Aceitei, pedi afastamento sem vencimentos do meu cargo de efetivo como Professor, pedi demissão do Clube de Regatas Tietê e voltei para Tupã para dirigir a rádio Piratininga, onde eu havia começado em 1964. É verdade que o estado de saúde de meu sogro (Jornalista Aleixo Correa Neto) que continuava morando em Tupã, foi um motivo importante e quase decisivo para que eu decidisse pela volta. Ele veio a falecer seis meses depois. Fiquei até a metade de 1980 em Tupã.

Os amigos de Lages também não se conformavam de eu ter saído de lá para ir para Florianópolis e de repente ter aparecido em Tupã novamente. E me cobravam para voltar ao Planalto Serrano onde deixara muitos amigos. Modéstia à parte, organizei uma estrutura que não existia em Lages na área de Educação Física e por isso deixei saudades. Eu também tinha deixado muitos amigos na área de comunicação, porque na época da rádio Princesa, eu viajei o estado inteiro e depois na Rádio Clube, embora por pouco tempo consolidei esses relacionamentos. Nessa época, embora tivesse morado apenas dois anos no estado, eu já podia dizer que conhecia Santa Catarina. Mas, fiquei indeciso quanto a retornar, pois não podia me aventurar de novo em Santa Catarina uma vez que ainda mantinha meu cargo de Professor Efetivo no Estado de São Paulo (eu apenas havia pedido um afastamento sem vencimentos e poderia reassumir meu cargo em Mauá há qualquer tempo). Então, disse aos amigos de Lages que só voltaria se saísse um Concurso Público para Professores em Santa Catarina e se eu passasse teria as mesmas condições de segurança que já tinha em São Paulo.

Ping: E saiu?
Mário MottaSaiu. E eu recebi em Tupã, num envelope, as duas inscrições, a minha e a da minha mulher. Não tivemos alternativa. Minha mulher estava grávida, não queria vir até por que iríamos deixar a mãe dela viúva recente sozinha em Tupã. Então eu falei: vamos lá, a gente presta o concurso e se passarmos a gente decide o que fazer depois. Para encurtar a história, passamos os dois. Escolhemos Lages. Eu pedi demissão da Rádio Piratininga, pedi demissão do meu cargo público junto ao Magistério Público paulista e voltei a Lages para trabalhar na Unidade Coordenação Regional de Educação que hoje responde pelo nome de Gerei - Gerências Regionais de Educação.

Em paralelo a isso, o Quirino Ribeiro, com quem eu tinha trabalhado na Rádio Princesa e que também havia se transferido comigo para a Rádio Clube a convite do Roberto Amaral lá em 1975, era agora gerente comercial da Rádio Clube e me convidou a trabalhar lá. Paralelo a isso, o Roberto Amaral tinha conseguido instalar a TV Planalto, que era o projeto de vida do pai dele. Carlos Jofre do Amaral tinha a concessão de uma emissora de TV para Lages válida por 10 anos e como esse prazo estava se esgotando, Roberto Amaral decidiu fazer uma parceria com a Perdigão, na época dirigida pela família Brandalise e cuja matriz era em Videira. Saul Brandalise Junior, hoje dono da Rede Barriga Verde, motivado pela iniciativa tornou-se o mentor da área de Comunicação da Perdidão Mas, por mais bem montada tecnicamente, ainda não havia estrutura nacional para manter a programação. A idéia de uma “rede nacional” ainda era incipiente e por esse motivo, tínhamos que produzir aproximadamente 10 horas de programação diária a partir de Lages.
Quando eu voltei, fui trabalhar com o Quirino na área de marketing, mas daí eu já me meti na programação da Rádio Clube
Eu cheguei justo nesse momento. Eu me considero privilegiado por dois aspectos. Primeiro porque comecei numa emissora relativamente pequena, que era a Rádio Piratininga, mas que me propiciou aprender de tudo. Eu cheguei a transmitir um campeonato brasileiro de beisebol no rádio.
Quando eu voltei, fui trabalhar com o Quirino na área de marketing, mas daí eu já me meti na programação da Rádio Clube, e em pouco tempo o Dr. Roberto Amaral me disse que eu não podia ficar no marketing. Quando eu percebi, eu estava apresentando um programa noticioso, O grande Jornal Falado Rádio Clube de Lages, e eu comecei a dar pitacos.
 “O Roberto, por que se chama Grande Jornal Falado Rádio Clube de Lages?”
 “Porque meu pai, há 50 anos, quando montou a Rádio Clube pôs esse nome.”
“Tá roberto, mas você vai na rua ali, pergunta, você ouviu essa notícia aonde? Aonde é que as pessoas te dizem?”
“Ah ouvi no Jornal da Clube.”
“Então por que Grande Jornal Falado da Rádio Clube de Lages? Vamos botar o nome de Jornal da Clube”
“não mas”…
Aquela dificuldade… “Tá bom Roberto, deixa eu colocar uma abertura diferente?”
Começa com a música de Honras Coroadas, uma gravação antiga da Banda dos Fuzileiros Navais do Rio de Janeiro, que parecia que era o mesmo disco de quando fundaram a rádio, Está no ar, o Grande Jornal Falado Rádio Clube de Lages um negócio pesado, mas não tinha como, era tradição da Rádio Clube, a família sentia orgulho e a maioria da população de Lages também.
Mas tinha que evoluir, se ele quisesse brigar com as outras emissoras. A rádio estava em terceiro lugar na audiência, tinha quatro emissoras só na cidade. Então bolamos uma nova abertura, com uma gravação moderna da música de Honras Coroadas, e criei um texto assim: Há mais de 30 anos esse som significa notícia, os tempos mudaram, mas a Clube mantém viva a tradição de bem informar. No ar, Jornal da Clube. Em pouco tempo, a Rádio Clube foi para o primeiro lugar de audiência. E logo em seguida, saiu a televisão. Eles começaram a trazer a televisão, e eu não mexia com a TV ainda.
Ping: Mas entrou para a televisão e foi fazer esporte?
Mário MottaFui fazer esporte. A TV Planalto não tinha programação nacional em rede ainda. Ela foi fazer TV em rede com a TVS, do Silvio Santos, quase um ano depois. Mas, durante esse início tínhamos que inventar programas variados para uma cidade como Lages e região. Um único programa era fruto de uma espécie de rede regional, via Embratel com a TV Guaíba de Porto Alegre e se chamava Guaíba ao vivo. Dentro dele, uma série de comentaristas em quadros fixos – como Lauro Quadros, Armindo Ranzolin, Eduardo Streeck, Lazier Martins enfim... E havia um quadro denominado EsporteVisão. Durante 20 minutos, um apresentador chamava as notícias e um comentarista dava sua breve opinião sobre elas. E um dia, na ausência do comentarista titular – Eugênio Martins Teixeira, como eu era formado em Educação Física e trazia alguns cursos técnicos na bagagem, fui chamado para substituí-lo.

Minha experiência com câmera tinha sido lá atrás, com sete anos de idade. Mas eu aceitei. Entrei e comentei. O conteúdo foi perfeito. Mas, como era gravado, ao assistir à noite percebi que eu piscava doidamente enquanto falava. Risos e mais risos. No dia seguinte, jurei que isso não iria acontecer novamente. E não aconteceu mesmo. No segundo dia eu arregalei e endureci de tal forma os olhos que não pisquei. Nenhuma vez. Risos e mais risos de novo. Então percebi que talvez o grande “segredo” da comunicação televisiva seja você imaginar que está conversando mesmo com as câmeras, como se falasse para alguém que está ali, dentro delas. Jurei que nunca mais iria me preocupar com nada além disso. Daquele dia até hoje, é assim que eu atuo.
Repórter Ping: Vamos falar um pouco mais dos trabalhos na Rádio Clube, que eu acredito que tenha sido o lugar onde você praticou, pela primeira vez, um jornalismo mais social, no programa A Hora da Corneta?
Mário Motta A Hora da Corneta foi trazida da Rádio Piratininga de Tupã. A gente já fazia isso lá. Tinha um quadro inclusive com esse nome. A única diferença, é que algo semelhante nunca tinha sido feito em Lages. No interior de São Paulo, esse tipo de quadro era mais comum.


Quando cheguei em Lages, percebi uma certa acomodação do radiojornalismo, quase como uma subserviência. Como eu havia recém chegado, sem comprometimentos outros ou relacionamentos consolidados, comecei a fazer um jornalismo absolutamente isento, tratando com respeito, mas cobrando o que entendia justo e correto. E recebi todo o apoio por parte do Roberto Amaral e seus diretores. No início, essa postura certamente assustou alguns políticos e outras pessoas. Mas aos poucos eles começaram a perceber que era uma cobrança absolutamente estruturada em argumentos convincentes e feita de forma inteiramente isenta. Talvez não fosse imparcial, até porque não se deve esperar imparcialidade no jornalismo. Você tem que cobrar isenção e a isenção é justamente isso. Se eu tenho que fazer uma cobrança, não importa quem seja, desde que ela seja justa. E eu comecei a agir assim. E mais: eu comecei a tentar antecipar as soluções, antes de colocar no ar a reclamação. Eu comecei a fazer o meio-campo entre o problema e a solução, sem qualquer outra intenção que não a de resolvê-los o mais rapidamente possível.
Na Capital
Ping: Aqui na Capital, você entrou na RBS assim que chegou?
Mário Motta Não. Eu vim para Florianópolis para trabalhar na Secretaria da Educação e para coordenar uma Sucursal que a TV Planalto havia montado aqui depois de conseguir um canal para por no ar sua imagem através de uma repetidora em São José. Florianópolis era a única capital brasileira que não recebia a imagem do Programa Sílvio Santos aos domingos e isso era cobrado diariamente pelo senhor Abravanel. Cheguei no dia 17 de fevereiro de 1986. Trabalhei três meses como Diretor de Jornalismo da sucursal da TV Planalto, montada nos altos da Rua Tenente Silveira em frente a Biblioteca Pública de Santa Catarina. Comigo além do senhor Jorge Salum (comentarista), seu filho Jorge Salum como nosso repórter. Foi uma experiência que me deixou saudades. No final de março, promovemos a final do concurso Miss Santa Catarina que o Silvio Santos havia adquirido nacionalmente. Para variar, quem apresentou o concurso aqui fui eu. Não tínhamos muitas opções de apresentadores, por isso lá vou eu num smoking enfrentar a plateia no Ginásio Charles Edgar Moritz do SESC na Prainha, comandando o Concurso de beleza e o Show do cantor Agepê. Exercitando uma política de boa vizinhança, o Roberto Amaral convidou para participar do júri o Diretor de Relações Públicas da RBS, Antonio Cabreira e o diretor Operacional da RBS. Nós ainda não nos considerávamos concorrentes da RBS. A forte concorrente deles em Florianópolis era a então TV Cultura, que tinha Roberto Alves como sua estrela maior.

Quando terminou o concurso, os dois Diretores da RBS vieram conversar comigo e me convidaram a subir o morro para conhecer melhor a emissora. O Jornal do Almoço, principal programa da emissora, já naquela época, estava sendo ancorado pelo jornalista Moacir Pereira, uma vez que Maria Lins havia sido contratada pela TV Bandeirantes de São Paulo. O Roberto Alves dirigia a TV Cultura e com seus diretores conseguiu tirar ao mesmo tempo o Moacir Pereira e o Miguel Livramento reforçando o Jornal do Meio Dia. Foi um golpe violento no Jornal do Almoço. Naquela época, era uma briga de audiência muito grande. A RBS não tinha muito mais que quatro anos e precisava urgentemente reestruturar o Jornal do Almoço, encontrando alguém para ancorá-lo. Aí me convidaram.
Ping: A emissora era uma potência?
Mário Motta - Já era uma potência. Tinha aqui, em Blumenau, e estava começando a montar em Joinville. Mas no Rio Grande do Sul, era uma potência. Tinha Zero Hora, Rádio Gaúcha. Já tinha umas dez emissoras pelo Estado todo. A tendência deles era chegar a Santa Catarina com muita força.
Ping: E aí sua estreia foi junto com o Diário Catarinense?
Mário MottaNo mesmo dia em que o DC foi às ruas. Minha primeira manchete como âncora do Jornal do Almoço, no dia 05 de maio de 1986 foi política: Vilson Kleinübing entra para o Partido Socialista Cristão. A segunda manchete foi: Nas bancas a edição número 1 do Diário Catarinense.

Defini que iria para a RBS no dia primeiro de maio, um feriado de quinta feira. Liguei de um orelhão da praia de Ponta das Canas e disse ao Délcio que aceitava a proposta, mas que precisava conversar com o Roberto Amaral. Me pediram para estrear na segunda feira, 05 de maio. Lá fui eu dizer ao Roberto que estava deixando a TV Planalto e ainda tentar a dispensa imediata sem o cumprimento do aviso prévio. Fui trabalhar na sexta feira e no final do expediente chamei o Roberto de um lado e disse:

“Roberto preciso falar contigo, estou indo embora”.

“Você tá morando na Trindade não é. Vamos comigo. Te deixo em casa.”

“Não Roberto, estou indo embora da emissora.

Pois o Roberto me disse que só me liberaria se fosse para ancorar o Jornal do Almoço da RBS, por exemplo. E eu disse que era exatamente isso que eu iria fazer. Ele então me desejou toda a sorte do mundo e ainda me liberou imediatamente com uma única condição – que o comentário A Hora da Corneta – que eu gravava aqui e enviava para Lages para o Panorama do dia seguinte (naquele caso – da segunda feira), fosse ao ar como minha despedida. Assim, naquela segunda feira, dia 05 de maio eu entrei nos dois vídeos catarinenses- estreando no Jornal do Almoço e com o quadro Hora da Corneta na TV Planalto de Lages.

Como já havia feito nos últimos cinco anos na TV Planalto, quando ao lado do Quirino Ribeiro coordenei as grandes coberturas dos Jogos Abertos de Santa Catarina, certamente isso motivou também a própria RBS a iniciar a cobertura dos JASC. Quando chegava os Jogos Abertos, a TV Planalto parava de transmitir sua programação regular. Você ligava na TV e assistia uma programação semelhante ao que hoje fazem as grandes Redes em cobertura de Olimpíadas, ou mesmo a ESPN ou a SporTV. E só tínhamos uma única e pequena micro ondas naquela época.
Desde que entrei na RBS, comecei a dizer, gente, temos que dar um jeito de ir ao encontro das pessoas nas cidades 
Tão logo conheceu nossa cobertura dos JASC de 1981 em Lages, Roberto Alves propôs uma parceria entre a TV Planalto e a TV Cultura para o JASC do ano seguinte em Itajaí. Eu tinha criado um slogan que é usado até hoje: TV Planalto - de braços e jogos abertos. Em verdade, trouxe essa ideia de nossa cobertura pela Rádio Piratininga dos Jogos Abertos do Interior de São Paulo em 1976. A parceria com a TV Cultura do Roberto Alves mexeu com a audiência, e como a RBS não tinha espaço estadual devido a não abertura da Rede Globo, perdia parte de sua audiência durante os Jogos Abertos. E não se conformavam com aquilo. Entrei na RBS para apresentar o Jornal do Almoço, mas logo em seguida fui convidado para Coordenar o Depto. De Esportes (por onde já haviam passado Luiz Carlos Prates e JB Telles). Coordenei o Esporte na empresa por três anos e fico muito feliz ao lembrar tudo o que fizemos.

Desde que entrei na RBS eu dizia – Senhores, precisamos ir mais ao encontro das pessoas nas cidades, nas regiões, enfim – no interior de Santa Catarina. Afinal, somos uma rede de emissoras que veio do Rio Grande do Sul e que ainda mantém essa forte visão do regionalismo gaúcho e é fundamental que quebremos isso. E, hoje posso dizer que a identificação com os catarinenses é fato consolidado.

Ping: Ainda nessa origem , o fato de você não ter o curso de jornalismo, teve algum dia que você se incomodou com isso? Que você pensou estou numa grande emissora, com grande audiência, será que eu estou preparado jornalisticamente?
Mário MottaSinceramente eu nunca pensei muito nisso. O que sempre me pareceu importante foi o acesso à informação, a vivência ao identificar e consolidar fontes e se a informação que eu estava transmitindo era correta. Ou seja, o que sempre me importou foi a teor de responsabilidade da minha informação. Porque na época era obrigado você ser sindicalizado e ter o DRT de jornalista. Eu só tinha e tenho a de Radialista. Não me era permitido assinar uma publicação jornalística, ser responsável por uma revista, por um jornal, mas nada me impedia de apresentar um programa como radialista, porque eu era um comunicador, ou melhor eu me considero um comunicador.
Se alguém não me considera jornalista, não é pelo fato de eu não ter diploma é porque ele não me considera mesmo
Se alguém não me considera jornalista, penso eu que não seja pelo fato de eu não ter diploma – mas sim porque ele não me considera mesmo. Ele não identifica no meu trabalho, um trabalho jornalístico. Eu não sou um Jornalista com diploma por uma série de circunstâncias. Confesso que gostaria muito de ter frequentado um Curso Universitário da área. Ultimamente tenho ido muito ao espaço acadêmico e discutido temas de muita responsabilidade. Participei da Cátedra RBS, disciplina que integra o currículo do Curso de Comunicação da UFSC. Fui conversar com os acadêmicos que estão quase se formando em jornalismo. E aí eu vou discutir o quê? Epistemologia? Teorias da Comunicação? Enfim? Talvez até pudesse, mas eu não vou. Poderia até discutir teoricamente as coisas por alguns aspectos que eu já domino, porque também não parei de ler, não parei de me buscar meu aprofundamento. Mas, penso poder aproveitar muito mais todas as experiências práticas que vivi e todas as histórias que humildemente ajudei a escrever e a construir.

Para você ter uma ideia, em 1996, embora eu fosse o mais velho da redação da RBS, fui um dos primeiros, senão o primeiro a navegar na Internet na redação. Talvez eu tenha sido a primeira pessoa, modestamente falando também, a colocar um computador no estúdio de rádio e abrir uma sala de bate-papo ao vivo, em tempo real para os ouvintes. Isso ocorreu em 1996, quando criei o neologismo “Ouvinternautas“ que mantenho até hoje. Para concluir quanto a exigência ou não de diploma, penso que se existe uma lei que exige o diploma para determinadas ações, eu serei o primeiro a defende-la. Se existe a Lei, então que o Diploma seja cobrado. Se eu não o tenho, ou vou para a Universidade reciclar meus conhecimentos e adquirir legalmente o Diploma, ou vou fazer apenas aquilo que a falta do diploma me permite.

Ping: Mário a tua apresentação no Jornal do Almoço ela é irmã gêmea do Diário Catarinense, como a gente falou aqui agora há pouco, o principal jornal do Estado. No entanto esses irmãos trilham caminhos diferentes. O que eu quero entender é porque você nunca escreveu no DC?
Mário MottaOlha, talvez justamente pela falta do diploma, mas, certamente não só pela falta do papel senão o Cacau [Menezes] não teria sua coluna desde o número um do DC. E embora a coluna tenha se transformado em “jornalística, isso aconteceu pelo talento do Cacau. Porque dá prá dizer que o Cacau não faz jornalismo? Gostem ou não, o Cacau tem uma coluna aberta. E ele trabalha muito bem as informações privilegiadas que suas fontes lhes dão. O Cacau desenvolveu e compensou, com um talento nato, o que talvez a falta do diploma quase o impediu. Mas dá pra falar que a coluna do Cacau é só jornalismo? Não, não dá. É também entretenimento, curiosidade, sociedade. Não é coluna social porque ele também nem gosta da denominação, mas também é e ele sabe disso. Mas só com muito talento se consegue usar muito bem o lado social da coluna com uma pitada de crítica social.

Eu não faria assim se tivesse uma coluna no DC como eu tenho no Hora, por exemplo. Talvez não tenha esse talento. Mas talvez hoje, o Hora represente para a RBS, o que o Jornal do Almoço de hoje representa para a TV. O Jornal do Almoço também foi sendo regionalizado.

Talvez eu não tenha ingressado no DC no início porque não trabalhava com o veículo efetivamente.
Ping: Quem sabe uma questão de público, seria isso?
Mário Motta - Talvez público, talvez por uma questão de coincidir oportunidade. Eu já escrevi pro DC agora recentemente, no redação-móvel. Hoje talvez haja um grande reconhecimento do Mário Motta multimídia do que existia há algum tempo. Eu sempre fui muito respeitado em TV, Rádio, mas eu não tenho, entre aspas, uma tradição de escrita para jornal. Embora eu escreva, e talvez porque eu também nunca tenha provocado muito isso.
Jornalista Multimídia
Ping: Vamos entrar agora na última parte da entrevista, onde nós vamos falar sobre o profissional multimídia. Tu és um dos mais prestigiados comunicadores do Estado, no rádio e na TV. Quero que você conte o que busca desempenhar em cada mídia, vamos começar pelo rádio, no programa Noticias na Manhã, da CBN Diário.
Mário Motta - Eu comecei em rádio, gosto muito de rádio. Acho que o rádio, como veículo te proporciona a fidelização do ouvinte muito mais que o público de qualquer outro veículo, especialmente na mídia eletrônica. O ouvinte é fiel e acima de tudo por um aspecto que eu acho importante no rádio, o ouvinte é o co-produtor da informação. Se você usa palavras cujo significado teu ouvinte não sabe, ele não vai entender o que você está dizendo. Então, você vai ter que buscar, na medida em que vai definindo seu público, um linguajar que lhe seja compreensível. E se você quiser estimulá-lo a buscar outras informações, que é também outra missão do rádio, não só informar, mas formar se for o caso, estimular a busca de novos conhecimentos, que você saiba como fazer isso, mesmo que seja repetitiva a informação, usando duas ou três linguagens diferentes, você consegue angariar ainda mais público.

Eu acho muito mais difícil você ludibriar teu ouvinte no rádio do que na televisão. Porque assim como você acha que a minha imagem pode me denunciar mais facilmente, posso garantir que ela também pode me ajudar a “interpretar” a falsa-verdade. Depende muito do “ator” que está apresentando o jornalismo que a televisão está oferecendo.
Ping: Mas o rádio não tem mais fantasia?
Mário Motta Então, o rádio depende mais da imaginação de quem ouve do que de quem fala. Você pode narrar um fato e ter dez pessoas ouvindo o rádio. Serão dez versões daquele fato, cada qual contando o que ouviu e/ou o que compreendeu e a partir daí serão dez versões distintas, que produzirão outras tantas...
E a televisão? Como vou te dizer… eu não edito o jornal que apresento. Eu talvez seja o último dinossauro da rede toda, incluindo as afiliadas da Rede Globo, que não edita o jornal que apresenta.
Ping: Isso é bom ou ruim?
Mário MottaEu não sei se é bom ou ruim, mas é muito provável que eu seja o último a fazer isso. Em primeiro lugar porque houve a mudança? Por que o Cid Moreira e o Sergio Chapelin saíram do ar no Jornal Nacional? Porque o jornalismo evoluiu no sentido de entender que o âncora, o apresentador, tem que estar com o jornal inteiro nas mãos, tem que estar com os fatos na cabeça; tem que saber do que está falando, pois se for necessário acrescentar uma informação ou se excluí-la eles saberão o que fazer. 

Então, quando o William Bonner e a Patrícia Poeta iniciam o Jornal Nacional, eles acabaram de fechá-lo com os editores secundários. Eles são os editores. Cid Moreira e Sergio Chapelin representavam muito bem os Apresentadores, Locutores, Noticiaristas. Pois é essa a denominação que trago em meu registro profissional. Na Carteira, eu sou Locutor, Apresentador, Noticiarista. Na prática busco ser sempre mais que isso. Hoje no meu registro em Carteira lê-se Newsman. Mas, você perguntou se é bom ou mal… acho que mal ainda não é, caso contrário eu já não estaria lá. E também é possível que eu compense muito da deficiência de não acompanhar a edição das matérias ali nas ilha da televisão, com o fato de estar mexendo com as mesmas notícias, com essas matérias no rádio durante toda manhã. E se eu tenho uma informação do rádio que não entrou na matéria do jornal, eu tenho hoje a liberdade dada pelo editor chefe do jornal, para acrescentá-la no corpo do programa. Já aconteceu de eu mudar a manchete do Jornal do Almoço por conta de uma informação obtida minutos antes no programa da rádio.
Ping: Eu gostaria que você avaliasse a qualidade do Jornal do Almoço. Você particularmente acredita que o programa faz um bom jornalismo? Que busca atender as necessidades das pessoas? que cobra das autoridades e que consegue provocar mudanças sociais?
Mário MottaHá algum tempo tivemos que fazer uma opção. Houve uma mudança substancial na forma do nosso jornalismo e até acredito que ele tenha se tornado muito mais social, muito mais provocativo para as mudanças sociais. Evidente que isso foi provocado pela concorrência. Nós passamos a ter de algum modo uma concorrência mais acirrada, não só da parte da Rede Record, mas também do próprio SBT que faz hoje um bom jornalismo, da Band e das demais emissoras que passaram a trabalhar dessa forma. Nós pensamos muito em como fazer o Jornal do Almoço mais popular sem torná-lo popularesco.
Ping: Qual a diferença?
Mário MottaA diferença é você fazer uso das matérias em prol do jornal ou da audiência e não das pessoas. É o sensacionalismo. Eu não estou dizendo aqui que os outros fazem isso e gostaria que as pessoas compreendessem que eu estou falando em relação ao Jornal do Almoço. Quando uma pessoa está com um problema para resolver e nós a ajudamos, buscamos o gancho de que muitas outras pessoas podem ter o mesmo problema e não sabem como resolvê-lo. Então não ficamos simplesmente no atendimento gratuito, individual, particular. Buscamos o coletivo. Essa é uma vertente.
Ping: A gente pode até dizer que é um pouco cruel isso, mas tem que ser dessa forma?
Mário Motta - Eu não sei se chega a ser cruel… Cruel talvez é o que é feito com as pessoas que nem têm a um tipo de cobrança mais fortalecida pela imprensa. Essa história de que a mídia é o quarto poder e tal, isso é relativo desde que você saiba como fazer o uso dele.
Ping: Você concorda?
Mário Motta - Eu concordo. Acho que a mídia hoje tem uma força muito grande. Às vezes, até atribuem à ela muito mais força do que tem. Mas acho que quando você usa de alguma forma o veículo (mídia eletrônica) que é uma concessão pública, não pode esquecer da sua enorme responsabilidade social. Nietzsche é quem diz, que o fato não existe; existem as circunstâncias que cercam o fato. Então cabe ao jornalismo buscar essas circunstâncias. O fato é a conclusão, o fechamento, a união dessas circunstâncias. Mas o que vai te dar o senso da avaliação, algo que o ouvinte ou o telespectador pode e deve fazer por si mesmo é o conhecimento do maior número dessas circunstâncias.
Enfim, eu acho que os veículos
 que não se abrirem para a participação de quem os vê, tendem a fechar suas portas
Nós também cometemos alguns exageros, alguns erros, é evidente. Mas nos tempos de hoje temos feito o jornalismo do Jornal do Almoço, para transmitir além da informação geral os principais fatos que compõem e escrevem a história da cidade, do estado, da região. O que temos feito é procurar filões ligados aos principais temas que dizem respeito a quem nos assiste, as pessoas para quem e com quem trabalhamos. Tanto que o próprio institucional da RBS foi evoluindo. A gente faz PRÁ você... A gente faz COM você... Enfim, eu acho que os veículos que não se abrirem para a participação de quem os vê, tendem a fechar suas portas.

Ping: Vamos pular lá para o impresso então. Fale um pouquinho sobre a coluna do Hora.
Mário Motta - A coluna do Hora começou com a escolha do nome, A Hora das ruas. Era um titulo interessante porque cabe tudo o que você quiser colocar. E a princípio a ideia inicial era falar do buraco da tua rua, era o problema da lâmpada que está queimada no poste faz duas semanas… Eram problemas comunitários. Mas eu comecei a perceber que o público do Hora pode, quer e merece mais do que simplesmente os pequenos problemas, que podem ser perfeitamente atendidos em outras páginas do jornal. E eu comecei a tentar a fazer no Hora aquilo que me apaixonou na área pedagógica lá atrás, na Educação Física.
Eu comecei a provocar nas pessoas, sempre que eu posso, um questionamento do que elas querem para as suas vidas. Acredito que o forte do Hora, e aí é onde entra a coluna, é a possibilidade de usar uma linguagem simples para falar até de assuntos complexos. Apesar de estar no Hora desde a sua edição número um eu ainda encontro, às vezes, dificuldade de falar de assuntos um pouco mais rebuscados, mas não deixo de publicá-los. Porque eu tenho a impressão de que eu não posso querer nivelar o meu leitor por baixo. Eu tento usar a coluna muito pra isso, incentivar a leitura das pessoas. Além das informações que eu acredito que podem ajudar as pessoas a melhorar a sua condição como ser humano, eu publico fotos de cães desaparecidos ou que precisam de famílias para serem recebidos… e por aí vai.
Ping: Para encerrar, eu queria saber quais são os teus sonhos e planos para o futuro, de que forma encerrar gloriosamente essa carreira?
Mário Motta - Uma vez perguntaram se eu pensava em aposentadoria…Eu sou aposentado já no Estado e pelo INSS há dois anos e continuo trabalhando. E toda vez que alguém me pergunta isso eu me lembro do John Lennon que tem uma frase que é relativamente antológica que diz assim “Vida é aquilo que acontece enquanto a gente está fazendo planos para o futuro”.
Eu não sei se eu vou chegar lá no futuro… Eu vivo desesperadamente o que eu estou fazendo e vivi assim até hoje. Eu não imaginava vir para Florianópolis, eu imaginava que eu ia trabalhar na RBS, eu não imaginava apresentar o Jornal do Almoço há 27 anos. Mas eu tento fazer da seguinte maneira: Hoje é isso que eu estou fazendo? É. Então eu vou tentar fazer da melhor maneira que eu puder, eu não sei por quanto tempo, nem até quando, mas é nesse encaminhamento que eu brigo, é por isso que eu luto. Eu gosto muito do que eu faço, então é como se eu não precisasse trabalhar na minha vida.

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