quarta-feira, 10 de julho de 2013

Um mundo sem olho mágico

Camila Albuquerque

Esses dias, observei um olho mágico pelo lado de fora - igual criança faz quando chega na casa da vó (pelo menos eu que era uma criança alta fazia). E como todas as outras vezes não consegui enxergar nada e isso também não significou muito para mim. Lembrei de quando eu era essa criança alta que pensava que olhos mágicos eram chamados assim por serem vistos apenas por adultos, por isso, então, eu nunca enxergava minha vovozinha do outro lado. Sentei no sofá e me senti vazia por não ter mais essa ingenuidade tão gostosa. Senti-me um maldito interfone.

Interfones me incomodam. A começar por não ter nada de mágico e imprevisível no nome. É só aquela caixa esquisita e branca pendurada na parede da cozinha te enchendo os ouvidos para lembrar que tá na hora de trocar rápido os pijamas e vestir os chinelos sem meias - no meu caso com as meias, sempre. E quando a gente abre a porta já sabe o tipo de sorriso que vai dar e a intensidade com que vai falar: seja bem-vindo!. Malditos interfones previsíveis. 

O que aconteceu com aquelas cenas de filme em que você de repente escuta a campainha e tem alguém com um buquê de flores e um sorriso no rosto? Os namorados não conseguem nem mais se fazer uma surpresa e é tudo culpa desses malditos interfones! Me diz por quê, por que concretizaram esse invento? O olho mágico era tão mágico que você podia sumir diante dele, mesmo estando ali de fato. Ora, eu me abaixava até quase sentar no chão e ora eu colocava o dedo indicador e ignorava os gritos dos familiares: "quem tá ai?". Caramba, que saudade de entender a utilidade de um olho mágico.

Tudo se tornou tão banal hoje em dia que até esses mínimos detalhes foram perdidos e esquecidos pelo tempo. Ninguém dá bola para eles, ninguém sente falta de só saber o horário por causa das refeições, de usar o que era confortável e medonho, de trocar de sapatos só quando rasgassem, de jogar tazo na hora no intervalo da escola em vez de baixar aplicativos no celular. Ninguém mais dá bola para a própria bola.

Acredito que as portas não foram as únicas a ficarem cegas. Estamos todos impregnados de previsibilidade e realidade. Onde foi parar o nosso senso nenhum? A nossa falta de noção com as coisas, as nossas mil perguntas bestas e nossa fome de biscoito? Claro que a infância passa e temos que amadurecer mas (PORCARIA), se tornar adulto é endurecer? Não gosto quando substituo sensações loucas por coisas monótonas. Não gosto de saber que ninguém mais sente falta do imprevisível, ninguém mais quer ser pego de surpresa. A mágica acabou, os interfones infincaram garras em nossas cozinhas e nossos olhos mágicos perderam toda sua magia.


Imagem: entreloucos.blogspot.com

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