quarta-feira, 8 de maio de 2013

Dos amores, o maior

Thaís Teixeira

Eu tenho uma prima que fará dois anos neste final de semana. Ela tem aqueles olhinhos pequeninos, doces e brilhantes das crianças que ainda estão descobrindo o mundo. Quando ela tinha um pouco mais de um ano, começou a andar, e ainda meio cambaleante, nos encantava com aqueles passinhos curtos e empolgados de quem ainda não sabe quantos passos longos ainda dará na vida.

Lembro quando ela ainda era um bebezinho recém-nascido. Minha tia tinha que trabalhar e o marido dela também, mas ela não confiava em deixar a pequenina sozinha com nenhuma babá. Como eu ainda estava no cursinho e tinha minhas tardes livres, ficava como uma babá auxiliar. Mas eu morria de medo de pegá-la no colo. Ela era bem miudinha, e molinha e tão frágil que eu poderia amassá-la com qualquer movimento brusco.

Um mês depois virei a babá principal e o medo foi embora. Passava as tardes fazendo-a dormir, andando de um lado para o outro do apartamento, cantando Cazuza, Chico Buarque e algumas letras em inglês que eu gostava. Acompanhei quando seus dentinhos começaram a nascer. Eles machucavam a gengiva e ela chorava agoniada. Eu não conseguia ouvir, tinha que ir pra alguém lugar onde não escutasse aquela dor daquele serzinho.

Acompanhei suas primeiras palavras também. Sabe aquele momento mágico que a criança abre a boca e começar a dizer “papai” e “mamãe”? Hoje ela sabe o nome de todo mundo lá de casa. Fala pelos cotovelos, repete tudo que nem um papagaio. Ela tem tanto prazer em falar, que tudo o que sair de sua boca vem com um sorriso. Ela ainda não sabe que daqui a pouco algumas das palavras que disser vão sair com lágrimas, dores e raivas. Ela ainda não descobriu esses sentimentos. Tudo ainda é festa, ainda é um grandíssimo parque de diversões.

Ainda será necessário alguns anos para que ela descubra que por ser mulher, as dificuldades vão dobrar. Que todo mês ela sentirá uma dor tão insuportável quanto a dos seus dentinhos nascendo. Ela vai descobrir que se apaixonar pela primeira vez é o fim do mundo, a segunda é um abismo e a terceira é maior das glórias. Ela vai aprender que bater de frente com os pais, porque eles não a deixam sair para uma festa, não vale a pena, que discutir desgasta e que o melhor caminho será sempre o diálogo.

Ela vai viver em um mundo que, provavelmente, ainda não foi destruído pela guerra idiota entre Estados Unidos e Coréia do Norte, mas com certeza estará imerso em uma 4ª Revolução – a digital. Ela não terá sonhos medíocres, irá desejar muito mais mundo e tudo o que ele puder lhe oferecer. A vida merece sempre mais.

E nos anos que se seguirem, e nas dificuldades de que passar – financeiras ou pessoais – ela descobrirá que dentro dela existe ainda uma faísca, um fagulho daquela época remota em que brincava no chão da sala da Vó, em que sorria quando falava e corria sem freios porque não importava o quanto fosse cair, a diversão valia por tudo.

Dois anos. Ela não está nem aí para as minhas previsões. Aliás, estou há um mês sem vê-la e é bem provável que fique toda desconfiada quando me encontrar. Ela é invocada, não dá bola pra quem não conhece. Mas também é fácil de cativá-la. Se ela abrir aquele sorriso bem grande é porque a barreira foi quebrada. Talvez seja exatamente isso que a faça brilhar tanto: seu sorriso.

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