quinta-feira, 25 de abril de 2013

Divagações pelo centro


Cristina Souza


Tenho um problema quando vou até o centro de Florianópolis: eu nunca consigo fazer só o que eu tenho que fazer e voltar para casa. Deixe-me explicar: o centro da cidade, principalmente depois das seis horas da tarde, possui um ar cheio de mistérios que muito me encanta. Enquanto as portas das lojas fecham e as pessoas correm freneticamente de volta para suas casas, as luzes amarelas, do mesmo tom das cervejas que preenchem o copo, deixam tudo mais interessante.

Nessa terça-feira, eu tinha que dar uma passada rápida no brechó. Era para ter sido rápida mesmo, só queria ver se lá tinha alguma novidade. Depois que descobri os brechós, em especial os que vendem melissa, objetos retrôs e afins, nunca mais os abandonei.  Não encontrei nada de “novo” na loja e segui em frente, mas entrei em uma rua que fugia da rotina. Lá, descobri um turco que vendia Shawarma por cinco reais e porção de fritas no mesmo preço! Claro que não resisti e jantei por ali mesmo, uma Shawarma muito gostosa (principalmente para meus bolsos).  Onde mais se  come bem por cinco reais, se não nos becos escondidos pelo centro da cidade?

Na próxima tentativa de ir embora, encontrei uma loja de bijuterias ainda aberta. O chinês, que estava na porta, me convidou para entrar. Mais curiosa com seu sotaque carregado do que com os produtos que oferecia, aceitei o convite. Comprei umas coisinhas (cinco reais também, lindos anéis!) e fiquei ouvindo um pouco da sua vida. A loja era nova e ainda havia pouco movimento, mas ele tinha fé que iria mudar logo. Não pude conversar muito mais porque sua esposa estava esperando, tinha que ir buscar os filhos. Agradeci e continuei caminhando, observando meu lindo anel novo. Saldo total: dez reais, barriga cheia, anel no dedo e uma sensação boa na cabeça.

 Mal cheguei à outra esquina e um menininho que saía de outra loja esbarrou em mim. Ele parecia ter saído do filme “Quem quer ser um milionário”. Sua mãe, com vestimentas árabes, pediu desculpas logo em seguida e puxou ele de volta para sua loja. Vi que ela estava com dificuldades para fechar a porta de ferro e ajudei. Conversei  um pouco mais com eles, encantada com a diferença de culturas e com a vontade dela de ter uma vida melhor, apesar das dificuldades financeiras  e do choque de etnias.

Parei na praça XV de Novembro para tomar um café. Lá, seu Zé, que estava ao meu lado, pediu um cigarro e reclamou que o café estava amargo. Eu reclamei que estava doce, afinal, por que raios as pessoas já vendem café com açúcar? Ele reclamou da aposentadoria que era uma mixaria e eu da dificuldade de se manter sozinha sendo apenas uma estudante. Ele reclamou da política, e eu do futebol. Depois ele do futebol e eu da ignorância dos policiais. Seguimos reclamando mais um pouco, até que ele teve que ir, afinal o transporte público de Florianópolis não estava nada bom.

Eram quase dez horas. Minha tentativa de fazer as coisas de maneira rápida e ir dormir cedo havia ido por água abaixo. Acendi mais um cigarro. Ainda no centro escrevi essa crônica. Não dava reclamar das horas de sono que desperdicei. Ficar acordada e descobrir essas histórias escondidas em cada canto no centro de cidade foi muito melhor. Imagina o que ainda existe por lá ainda e ninguém presta atenção?

Foto: Cristina Souza

Um comentário:

Luiz Fernando disse...

Bela Crônica, compartilho do mesmo sentimento, quando visitei a Ilha da Magia em setembro passado, adorei o efeito do centro da cidade após as 18 horas, algo que me encantou e me marcou...

Parabéns pelo texto