domingo, 3 de março de 2013

Chegadas e partidas

Eu estava sentada em um restaurante da Victória Station e comecei a me distrair com as pessoas e suas malas. Eu esperava uma amiga para irmos comemorar seu último dia em Londres, acompanhada por um chocolate quente e o livro do Cazuza. Esta é a segunda vez que leio a biografia dele, o livro é uma entrevista que sua mãe Lucinha Araújo concedeu a jornalista Regina Echeverria. Em algum momento da minha distração, a combinação Cazuza, malas e despedida fez algum sentido.

Londres sempre foi meu sonho. Quando era pequena imaginava meus dias na cidade real, conhecendo os palácios, museus, monumentos. Depois de grande, e sabendo o que queria da vida, comecei a traçar meu futuro no Daily Mail, um dos principais jornais de Londres. Mas, assim como os planos, os sonhos também mudam e apesar de eu estar passando esses dois meses em terras britânicas, minhas expectativas são outras e se encontram em território brasileiro.

Daqui, de Victória Station, partem e chegam ônibus e trens. Pessoas esperam e se despedem. Embora não seja um aeroporto, é um lugar que me faz lembrar muito uma música do Cazuza “…Cada aeroporto é um nome no papel; Um novo rosto atrás do mesmo véu; Alguém me espera e adivinha no céu que meu novo nome é um estranho que me quer…”

Cazuza viveu intensamente cada momento de sua vida mesmo depois de descobrir que estava com AIDS. Ele influenciou toda uma geração com suas letras e sua voz. Louco, insano e cativante. Uma vez, numa de minhas aulas de inglês, nós alunos tínhamos que falar sobre nossos cantores e bandas prediletos. Sem pensar duas vezes falei: Cazuza. "How do spell that?" Perguntavam-me os alunos e o professor, e eu repeti devagar: C-A-Z-U-Z-A. Com alguma dificuldade todos conseguiram pronunciar seu nome.

Mas esse falatório todo sobre o Cazuza é por um motivo: o título do texto. Em dois meses aqui em Londres você vê tantas chegadas e partidas que é impossível contar. Em todas as segundas-feiras, por exemplo, chegam novos alunos na Escola de Idiomas Eurocentres, a maioria brasileiros. Esses novos alunos costumam perguntar para nós: onde vocês vão almoçar hoje? E assim se estabelece o primeiro contato e o início da amizade.

Cada um que chega a Londres tem objetivos diferentes e o tempo que ficarão aqui também varia. Os que vêm para passar um mês querem correr desesperadamente para conhecer cada canto da cidade. Os minutos e segundos são preciosos. E nada de ficar dormindo de ressaca por causa dos pubs. Os 80% de presença obrigatórios para receber o certificado de conclusão do curso faz a galera ir pra aula parecendo zumbi, com a roupa do dia anterior, e sem ter dormido à noite.

A lei para os calouros é Carpe Diem, expressão latina retirada de um poema de Horácio (não o revisor deste sítio, mas o outro, o famoso poeta romano), que significa: colha o dia, aproveite o momento. E, de fato, as pessoas levam a sério isso!

Londres não é como no Brasil e, infelizmente, não podemos trazer nossas pessoas amadas para cá. Aí, depois de um mês, você não sabe se quer voltar ou ficar. A saudade bate mais forte que o coração bateu quando viu o Big-Ben pela primeira vez e pensa se já não está na hora de voltar, apesar de que toda regra tem sua exceção.

Voltando das minha divagações para a Victória Station, fico imaginando para onde essas pessoas com malas vão. Voltando para casa, indo para a viagem de seus sonhos, ou até mesmo um passeio para conhecer outras cidades da Inglaterra. Seja qual for o destino, elas estão contentes, e seus sorrisos são bonitos e esperançosos.

O meu chocolate quente chegou ao fim no mesmo instante em que, lendo a biografia do Cazuza, cheguei na parte onde é narrado o último show de sua carreira. Cazuza foi um vivente à flor da pele e tudo o que podia ter aproveitado, despediu-se de mim por meio das páginas de um livro para que eu o mantivesse vivo em minha memória.

Assim como minha amiga, que minutos depois foi ao meu encontro, e todos os outros que voltaram para o Brasil, que acabaram de chegar em Londres e os que ainda conhecerei amanhã, segunda-feira.

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