terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A delicadeza da verdade

A tênue linha entre verdade e ficção no jornalismo

Nas primeiras disciplinas do curso de jornalismo os professores ressaltam a necessidade de os estudantes terem compromisso com a verdade, pois é de suma importância ao desenvolvimento da carreira jornalística. Porém, a linha entre a verdade e a ficção é muito tênue. Para alguns escritores, não existe verdade, apenas pontos de vista. Foi diante dessa questão que abordei o conceito no artigo “A verdade é manca, mas sempre chega a tempo”, pois sua concepção é muito ampla e pessoal.

Na prática da profissão, entretanto, esta linha, por mais fina que pareça, tem que estar bastante visível para um periodista. É bem diferente recontar, com suas próprias palavras, uma história que foi ouvida, do que inventar com sua criatividade e conhecimento literário fatos e cenas que nunca existiram.

Para o eterno Chico Anysio, a realidade é a ficção que não deu certo. Nelson Rodrigues, o jornalista que perpetuou as crônicas, também teve seus problemas com o real e o imaginário. Conta a professora de Pós-graduação em Linguagem da Unisul, Dilma Beatriz Rocha Juliano, que em seus primeiros anos de profissão Nelson rodeavas as delegacias em busca de uma boa história. Porém, como chegava sempre com atrasado ao local dos acidentes, usava sua genialidade para coletar apenas as informações mínimas e necessárias para reconstruir a cena a partir de sua criatividade e habilidade literária. Depois, para a historieta parecer uma real historieta, pegava fotos dentro do arquivo do jornal e publicava com a matéria.

O filme O Preço de uma Verdade (2003), dirigido por e Billy Ray, é inspirado em um caso real e trata justamente deste assunto. A película conta a história do repórter Stephen Glass que trabalhava para a The New Republic, revista estado unidense de opinião pública. O jovem jornalista carismático e obstinado necessitava de matérias que fossem relevantes e verdadeiramente significativas para mostrar seu talento aos colegas de redação e, principalmente, ao editor.

Então, o jovem escritor foi atrás de matérias raras e assim passou a se destacar por publicar vários artigos em um curto período de tempo, no qual vivia situações inusitadas, virando ícone político da The New Republic. Eram publicadas reportagens que de início foram parcialmente forjadas, mas que ao longo da trama evoluem para totalmente fictícias.

Em maio de 1998, o jornalista publicou uma de suas maiores reportagens “O Paraíso dos Hackers”, em que falava a respeito de um hacker de 15 anos que invadiu a rede de computadores de uma grande empresa de informática e quando descoberto foi contratado pela mesma empresa com exigências absurdas. A matéria de Glass chamou a atenção do jornalista Adam Penenberg, da Forbes Digital Tool, que duvidando da veracidade dos fatos pesquisou na internet os nomes ligados à reportagem e não obteve nenhum vestígio da existência da empresa, tampouco do garoto, constatando que a reportagem era falsa.

Dessa forma, o repórter foi pego em uma rede de escândalos e fraudes jornalísticas. 27 dos seus 41 artigos publicados na revista eram parcialmente ou totalmente forjados. Em seus escritos, o rapaz contava histórias, fatos, fontes e cenários irreais, usando sua genial criatividade.

O filme coloca em xeque os valores da verdade no ambiente jornalístico. O que nos leva a pensar: em qual ponto da história ela deixa de ser realidade para virar ficção?


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