quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Uma visita à Liverpool

Nota ao Leitor
Talvez você, leitor, já tenha notado que o planejamento dessa cobertura não saiu como esperado. Além de a Inglaterra ser um país desconhecido por mim e das dificuldades da comunicação por causa do inglês - às vezes enrolado, às vezes insuficiente - os planos para uma série de entrevistas sobre Londres talvez tenha ido por água abaixo. Mas, não quero nesta carta ficar me lamuriando a você. Afinal, só estamos na metade do caminho e muito ainda pode ser mostrado. O que quero contar, sem amarras, é que diabos estou fazendo aqui - além de escrever em muros. 
Uma visita à Liverpool

O que contarei hoje tem a ver com Liverpool, The Beatles e com a escola de idiomas Eurocentres. Vou me referir, nesse instante, ao texto que deu inicio a essa série, quando citei Virgínia Woolf. Em um de seus livros ela disse que não se pode conhecer Londres, sem conhecer um inglês nativo. Se Woolf estivesse viva eu lhe diria que esse inglês eu encontrei em Liverpool. Ah, Liverpool! Estar nessa cidade, talvez, tenha sido uma das experiências mais emocionantes desde que cheguei à Inglaterra. No museu The Beatles Story, chorei como criança. Senti arrepios quando o guia começou a contar a história de John Lennon, Paul McCartney, Ringo Starr e George Harrison.

Tive ainda mais arrepios quando passei por pedaços importantes e marcantes da vida dos quatro artistas. E o que dizer sobre os discos e as músicas inesquecíveis como Penny Lane, Yellow Submarine, I wanna hold your hand, Let It Be e tantas outras? Depois de, aproximadamente, uma hora aprofundando meu conhecimento sobre a história da banda, encontrei uma sala com espaços reservados para cada um dos Beatles.

O primeiro, ele: John Lennon. Segurar as lágrimas foi impossível quando enxerguei a seguinte mensagem estampada numa parede preta: "Deus é um conceito pelo qual medimos nossa dor. Falarei de novo, Deus é um conceito pelo qual medimos nossa dor. Eu não acredito em mágica, eu não acredito em I-ching, eu não acredito em Bíblia, eu não acredito em tarô, eu não acredito em Hitler, eu não acredito em Jesus, eu não acredito em Kennedy, eu não acredito em Buda, eu não acredito em Mantra, eu não acredito em Gita, eu não acredito em Ioga, eu não acredito em reis, eu não acredito em Elvis, eu não acredito em Zimmerman, eu não acredito em Beatles. Apenas acredito em mim, Yoko e eu. E essa é a realidade. O sonho acabou. O que posso dizer?O sonho acabou. Ontem, eu era o tecedor de sonhos, mas agora renasci. Eu era a morsa, mas agora sou John. Então queridos amigos, vocês precisam continuar. O sonho acabou.". Assinado, John Lennon.


Sair do museu e seguir para o The Cavern Pub, o bar em que os The Beatles iniciaram sua carreira, em 1961, foi uma sensação sobrenatural. E se o pub por si só, com as bandas tocando os sucessos dos garotos de Liverpool, já me pareceu fantástico, o que dizer do momento em que a música "Hey Jude" invadiu o Cavern? O lugar era pequeno, mas estava lotado, e todos, absolutamente todos que lá estavam, levantaram as mãos e cantaram: "Hey, Jude, don't make it bad, take a sad song and make it better. Remember to let her into your heart, then you can start to make it better..." O que vivi nessa noite valeu cada pound gasto e até o cartão de crédito perdido!

Ah! E quanto a Liverpool, o que posso dizer? Ela é jovem, repleta de universitários e por isso, a vida noturna é agitada. Ainda não descobri um lugar onde você possa entrar em sete baladas seguidas sem pagar nada por isso - uma maratona e tanto. Uma das paixões da cidade é, sem dúvidas, a música - tem até uma revista especifica, chamada Bido Lito! Liverpool não é muito grande e também, não é uma cidade cara. Talvez essa seja uma das razões pelas quais praticamente não existam turistas por lá. Aliás, Virginia Woolf, foi visitando Liverpool que conheci os ingleses e, durante um final de semana, não ouvi português nem turco.

London, London

De volta à Londres e à Eurocentres, quero apresentar-lhe algumas pessoas. No primeiro dia de aula, 14 de janeiro, conheci uma sul-coreana, uma cazaquistanesa e um turco. A moça da Coréia do Sul é designer e seus desenhos parecem animes. Talento ela tem de sobra. É um pouco difícil entender a pronuncia do seu inglês, mas entre mímicas e escritas nos damos muitos bem. A cazaquistanesa e o turco já terminaram o curso. Ambos são médicos, ela anestesista e ele clinico geral. Não deu tempo para que eu os conhecesse muito bem, mas nas duas vezes em que estive doente aqui foi aos dois que recorri para uma recomendação de remédio.


Numa pub nigths - noite em que a escola promove encontros em algum clube da cidade - os brasileiros se juntaram aos coreanos e foi uma festa. Depois de algumas cervejas, as dificuldades de vocabulário e com a gramática evaporaram e o inglês virou nossa língua mãe. Não tem um dia que eu não encontre um deles pelo corredor sem escutar "Hi, how are you?". Por mais que as culturas sejam muito diferentes, estar em um país estrangeiro, longe de pessoas queridas, da nossa língua nos torna mais abertos a conhecer as pessoas

Não falo apenas dos estrangeiros. Há muitos, muitos brasileiros na Eurocentres vindos de estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Pernambuco, Roraima e etc... Essa miscigenação no próprio país é importante e essencial, para que possamos ver que não é preciso viajar para conhecer outras culturas. Com tanta gente de diferentes estados convivendo junto e praticamente o dia inteiro, é bem capaz de eu sair daqui com todos os sotaques misturados - menos o britânico!

Talvez, leitor, exista muito mais para conhecer nas pessoas do que nos lugares. O que faz de Londres uma cidade fascinante é justamente essa miscelânea de rostos, vozes, jeitos e manias. O que tem feito desse intercâmbio algo inesquecível para mim não são apenas os lugares que visitei, mas também as pessoas que encontrei aqui. E para encerrar essas experiências que partilho com vocês, imagine-se no The Cavern. Feche os olhos e sinta a emoção de estar pisando no mesmo chão que os Beatles pisaram: "...There's nothing you can do that can't be done.Nothing you can sing that can't be sung. Nothing you can say but you can learn how to play the game. It's easy..."


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