quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Eu e a solidão em meu quarto

Estou sozinho em meu quarto. Na verdade, há um computador em que descrevo essas linhas e também uma taça com vinho. Esses são os elementos físicos, há também elementos climáticos, como o calor que me força a ligar em nível três o ventilador. Também há elementos espirituais: em cartaz a solidão. A senhora solidão não é negativa como você pensa leitor. Aliás, se não fosse esse o meu estado espiritual, provavelmente, o vinho não estivesse aqui, e ele é importante nesse momento.

Cada utensílio realmente tem utilidade. Salva de palmas a quem elaborou esse substantivo que atende tão piamente a função. Utensílio lembra utilidade, utilização, algo que é útil. Tudo, na verdade, é útil, desde o parágrafo ao ponto final. Perdoem a falta de criatividade e o exemplo medíocre. Posso arrumar dizendo que taça de vinho, ventilador e computador são importantes, pelo menos nessa circunstância solitária na qual me encontro.

A solidão não é um estado negativo. Entendo-a como benéfica, quando dosada. Assim como, qualquer droga que existe nessa droga de mundo. Acompanhado da solidão, posso conhecer meus medos e traçar a fórmula para vencê-los. Consigo ouvir minha própria respiração e perceber suspiros da alma. Presto atenção à letra e fecho os olhos curtindo a melodia sem que ninguém me observe e pergunte o que tenho. Não interessa o que tenho nem o que não tenho, mas o que posso viver em solidão.

Estar só não quer dizer exatamente estar só, pois os pensamentos trazem pessoas e com elas sentimentos variados. O sorriso dos amigos, a palavra da pessoa amada, o pedido do filho, o conselho do pai. Por vezes os pensamentos trazem a própria solidão. Isso acontece quando observamos a foto do filho que infelizmente se foi, da mulher que nos deixou sem explicações aceitáveis. O pensamento é o pai de todos os sentimentos, é a casa das boas e das más recordações. Ele agrega, constrói, destrói, encanta, ensina, corrige, remonta, define, redefine.

Tudo para nada. Por fim a morte é quem toma conta de tudo e caímos no esquecimento. Desacredite nessas palavras amigo leitor. Isso é discurso de gente frustrada e solitária. Acredite que haverá uma recompensa valiosa em cada boa atitude e dissemine o bem. É provável que todos tenham o mesmo destino realmente, mas por que não arriscar? É possível fazer a diferença e mais do que isso ser diferente. Isso depende da forma como se acorda todos os dias e da forma como se dorme todas as noites. O sono é importantíssimo.

Durante a noite vêm os sonhos. A forma mais fácil de escapar da crueldade desse mundo e da solidão é o sono e, consequentemente, os sonhos. A vida é uma confusão de dimensões. Por esse motivo alguns sentimentos são fortes e imortais. Por mais que você tente se desligar do mundo ele jamais se desligará de você. Dois caminhos, no entanto, permitem essa fuga. O primeiro, e menos aconselhável, é o manicômio. Desconheço explicações sobre o estado em que se encontram os loucos, mas eles não vivem a loucura dos seres humanos normais. Outra maneira é o sonho e por isso dormir bem é crucial à saúde e à vida.

Detecto fuga parcial do tema e do título. Não entendo que a solidão esteja indo embora. Ela é imortal, atemporal, cíclica e ousaria dizer que todos têm conhecimento disso. Eu sou muito medíocre, é claro que todos conhecem a solidão. Quem nunca dormiu com ela que atire a primeira pedra! Ela voltará amanhã. Certamente furiosa e vingativa. A solidão percebe que aprendi a conviver com ela, mas isso não a interessa. Ela entende que todo domínio é dela. Por isso quer me surpreender e quer que eu me entregue, que eu chore. Isso não acontecerá. Alguém lá em cima me tratou.

Caríssima solidão, serei eternamente grato a tua visita e atenção. Tendo em vista o adiantado da hora, deixo você em paz e vou repor o sono na tentativa de descansar, e claro, de sonhar com algo bom, desligando-me assim dessa loucura que vivo e compartilho com os seres humanos. O vinho acabou, mas não é por isso que te deixo só. Vou agora porque meus leitores estão cansados de mim e da estrutura textual que eu propus. Volte solidão, mas demore a me perturbar.

Nícolas David

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