segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Algures

Olho do terraço a cidade acordando e tenho dúvidas se era realmente aqui que eu deveria estar. Vejo pombos voarem, luzes apagarem, vejo meu último cigarro vencer a barreira dos andares.

De etéreos olhos confidentes a me nublar o raciocínio pergunto a minha memória onde viemos parar, tenho dúvidas se estamos todos em casa, ou ainda não a conseguimos encontrar. Vejo toda manhã as cores desbotarem, desintensificarem-se, seja aqui, em Londres ou em Shangri-La. Vejo as vidas desgastarem, tentando chegar a algum lugar, vejo as pessoas passarem, correndo o relógio, pensando em sua próxima localidade a alcançar.

Daqui de cima, não sei se meus pés estão no chão, acho que nessa madrugada, acabei por me perder em algum lugar, entre o rotineiro e o inexplorado, entre onde estou e deveria estar; de peito oco, por onde estive e onde queria me encontrar, meio roto, por onde nunca fui mas queria ficar. Não me acho aqui por cima, mas acredito, que nem lá embaixo poderia comigo topar, andando de sítio em sítio sem nunca se fixar.

Cigana sensação, de não poder se encontrar, essa tola fascinação, por esquinas e endereços, por querer cada espaço identificar. Um eterno deja-vu - tudo tão familiar - as mesmas placas e propagandas, as mesmas cenas a reprisar. 

Vejo lá em baixo, pessoas que sei que não estão ali, todas perdidas em seus próprios devaneios, retrocedendo ou antecipando em suas mentes os momentos ainda por vir. Aqui de cima, faço-me onisciente a tudo reparar: vidas mal vividas, pelo conforto a procurar, correrias, pulando espaços, enganando-se, sempre longe de suas covas acreditando estar. 

O dia já se encontra claro, mas agora, o tempo não me vale mais. Presente, futuro e passado, são resumidos no mesmo estado, o de sempre se estar em outro lugar. Mesmo assim, o relógio por fim grita, insistindo o dito momento de se mandar, mas não estou nem aí, na verdade, talvez nem mesmo aqui eu deva estar.

Gessony Pawlick Jr.

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