segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Um brinde com água

Nesta frenética corrida noite a dentro, lembro-me dos copos que enlevo levantei, cada um acompanhado de frases de efeito, de mãos ao alto, comemorando e desgraçando os sentimentos que com a dose em punho alcei. Da cana ao anis, com todos os gostos, minhas saudações misturei, assim como, meio tolo, de língua travada, sempre minhas homenagens prestei. Fui meio louco também, quando a desconhecidos minhas dores confessei, ou quando desgraçado, brindei sozinho minha musa da vez.

Desta vida resumida, muita taça em punho levei, como meu mais brilhante estandarte, como a rubra bandeira de minha incoercível embriaguez. Dos brindes virei quase um poeta, declamando uma dor por vez, sabendo sempre a hora certa, da anedota e da mudez.

Gim, uísque, rum. A lembrança da vertigem, do ímpeto do movimento, do ricochete da cabeça, no shot engolido lento, a fim de que as palavras de uma vez se esqueça. Fugaz é a essência do brinde, mas sustenta-se por si só, sendo a síntese da noite, o mote bradado - quase recitado - extraindo da pandega o melhor.

Brindes são a conclusão de cada conversa, o motivo do encontro, o engodo da festa. É em cada copo a representação do florete da elite da guarda francesa. Não é só aquilo que sustenta a noite, mas também aquilo que a alicerça. 

Cada brinde tem a dose amarga que o mereça, deixando o peito transbordar ao bater dos vidros, no êxtase da emoção, o ápice do sentimento que a tona transpareça. Um brinde com água é o vazio da existência, é brindar a infâmia ou a qualquer coisa que do limbo lhe acometa. É ato digno dessa prosa, é o vácuo raso das palavras sem leveza, é esmorecimento mútuo, é simples romantismo de veneta.

Brindar com água, não é coisa que se digne nem ao capeta. Pode ter sua dose de fantasia, mas é o mesmo que excluir o sabor de suas próprias receitas. É não temperar as frases, é deixar-se levar por palavras sem profundezas, é, por fim, não acreditar na literatura dos bêbados, em seus compêndios epifanicos de pureza. É disparate ao gosto de cada sentimento, que explodindo pede a harmonização, pelo álcool que lhe entorpeça.

Gessony Pawlick Jr.

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