quinta-feira, 26 de julho de 2012

O nocaute de Anderson Silva

Lutador golpeia a história do Brasil, derrubando Guga, Senna e Pelé 

Aqueles que não estiverem na lista abaixo não devem imaginar que sua filosofia não serviu para ninguém. Eles devem saber sim que sua filosofia não foi útil ao autor desse texto, que imagina estar deixando cara filosofia para alguém.

Papai, mamãe, professores de matemática, Chico Anysio, Getúlio Vargas, Raul Seixas, Samuel Wainer, Machado de Assis foram super-heróis; membros da posteridade; patrimônio irrefutável da história.

Os brasileiros, povinho acostumado à labuta e à baixa remuneração, estão acostumados a nomearem mártires. Há pouco, citei alguns do passado.

O esporte é uma interminável fonte desses ilustres e honoráveis cidadãos. Pelé, Ayrton Senna, Gustavo Kuerten são alguns dos que me lembro por hora.

O futebol, do Rei Pelé, é o grande laboratório e os futebolistas não podem sair do trilho. Os atletas, aliás, não podem fazer nada que os seres humanos fazem. Adriano não podia fumar, Ronaldinho Gaúcho não pode ir a festas. Sexo é proibido em tempo de Copa do Mundo.

Além disso, a publicidade precisa das dicas desses heróis. O povo precisa saber que o Monange da Xuxa é o caminho da beleza. Que a Nextel do Neymar é a melhor linha de telefone. Adriano, provavelmente lamenta que o cigarro não seja aceito pela sociedade de bem. Se fosse, as marcas brigariam por ele. E os clubes ainda o aceitariam.

Agora, o Brasil se abre a outro ídolo e ao pacotão da idolatria. Além de torcer para que as pancadas de Anderson Silva em seus adversários sejam estonteantes, os mais atentos ao mercado de tendências abrem academias para lutas, competindo com as escolinhas de futebol na preferência dos jovens e extinguindo a pelada de golzinho fechado na rua. 

A ascensão de Anderson Silva é oportuna. Na política, Demóstenes acaba de nocautear os escassos créditos que a nação tinha. Na fórmula-1 de Ayrton Senna, enquanto Fernando Alonso disputa o título pela Ferrari, Felipe Massa passa despercebido tendo o mesmo motor que o espanhol. No futebol, o Brasil nunca esteve tão mal colocado no ranking da FIFA.

Anderson não é um covarde que bate de graça dentro do ring. Silva é um atleta que pratica seu esporte. O povo brasileiro é que não tem o direito de amar bons moços. Não há nenhum disponível no mercado.

O que é bom é o que dispersa. Ninguém quer saber se estamos perdidos. É preferível ouvir o Tchu Tcha Tcha Tcha e dançar, dançar, beber, beber, beber, sorrir, sorrir, como se nada estivesse acontecendo.

A culpa não é de Anderson, não é de ninguém. A culpa é da história. A culpa é desses tempos contemporâneos onde Michel Telo é o melhor artista brasileiro. A culpa é desses tempos em que os super-heróis do cinema blockbuster salvam o mundo em duas horas.

A culpa, na verdade, é de gente como eu e de gente que acredita em minhas palavras. É essa gente que impede a felicidade do resto do mundo. Esse pensamento velho que carrego está à beira da morte, como todos os velhos.

E isso estará registrado nas bibliotecas dos nossos netos. Lá, os historiadores contarão que um monte de velhos mudou-se para a Lua, pois não conseguindo lutar contra os outros e resistindo à união, preferiu ir para bem longe.
Nícolas David

Um comentário:

Crispi. disse...

Bom texto heim Nícolas! Sou contra a glamourização dos atletas. Acho que a gente tem que ter admiração pelo trabalho e esforço deles. Como atleta sei o quanto é difícil chegar lá. Mas também sei o quanto é chato ter que ser vigiada o tempo todo por pessoas que acham que não podemos ter vida "mundana" também.
E que tristeza essa nossa falta de cultura. Um país que enaltece Teló e discrimina os "esquisitos" que gostam de Cazuza, Legião, entre muitos outros, merecem mesmo - com o perdão da palavra - essa merda toda.