sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Ouçam as bocas de lobo

A questão era latente, mas há muito ele já havia sumido, não era mais o suficiente para se importar. Camuflava-se bem, cada um andando de par em par. Mas ele não estava mais ali, onde deveria estar?

Escoava fugaz em ínfimas relações, entre jovens em farra e rameiras com suas falsas alusões. Não era mais de Dulcinéia nem de Julieta, permeando a noite, rastejava entre um brilho e outro, de um céu pingado de janelas acesas. Das serenatas ele não sabia mais, da compaixão então, quem dera meu rapaz! Perdido, aturdido, pelo desprezo sem fim, ninguém mais sabia onde estava Eros, aquele descuidado serafim.

Foi quando ao romper da madrugada, em uma segunda a despertar, explodia a cascata rosa por incógnitas mãos que resolveram por ele perguntar. Rosa! A cor das flores, do tímido enrubescer, das úmidas bocas apaixonadas, das tristes carnes acossadas. O choque do rosa, descomprimindo-se de dentro da lata spray, agarrando-se a calçada, liberto, espalhando-se em instintiva insensatez.

E de codinome vermelho 255, verde 0 e azul 255, a mensagem marcou o chão, gritando com a veemência vivaz da tinta fresca, incrustrada no solo, pedindo socorro como quem se afoga, suplicando um mínimo de atenção. Alheios a dor rosada, atropelavam-na pés e rodas, sem nunca darem-lhe respostas, pistas nem razão.

A cor impregnou as entranhas do solo, e conforme as manhãs surgiam entre versos de pardais, bueiros apareciam pintados por toda Campinas, renegando as palavras de Shakespeare, com metálica rosa de fétido perfume, mas ainda assim rosa. Da negra boca lupina desabrochava a rosácea flor de ferro, daninha que germinava nas noites desta semana, registrando que foi preciso de um profeta anônimo para nos mostrar por onde ia o nosso verdadeiro amor.

Crédito das fotos 02 e 03: Gessony Pawlick Jr.
Gessony Pawlick Jr.

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