No dia 17 de maio, a Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) passou o filme Uma Onda no Ar, proposta oferecida pelo projeto
Cine Paredão, que tem como objetivo criar uma discussão sobre arte e cultura,
apresentando materiais fora dos padrões pré-estabelecidos. Por esse motivo, as
obras mostradas nesse projeto fogem do caráter comercial, optando
sempre por um audiovisual alternativo e/ou independente. Então, aproveitando
que maio é o mês da abolição da escravidão, o filme veio para discutir essa
proposta.
Uma Onda no Ar estreou
em 2002 e foi dirigido por Helvecio Ratton, diretor também de outros curtas e
longas como: Em nome da Razão (1979), Dança dos Bonecos (1986),
Menino Maluquinho (1994), Amor e Cia (1999), O Casamento de
Lara (2004), Procissão das Almas (2004), Batismo de Sangue (2006),
Pequenas Histórias (2007) e O Mineiro e o Queijo (2011). Ratton
nasceu em 1949, na cidade de Divinópolis. Foi militante ativo no movimento
estudantil da década de 70, até o momento em que se exilou no Chile. Voltou
para o Brasil mais tarde, formando-se em psicologia pela PUC de Minas Gerais.
Notamos algumas influências de sua militância neste filme.
Primeiramente, leitor que não está familiarizado com cinema independente, não
espere efeitos especiais hollywoodianos e a mesma trama feijão com arroz, pois
a proposta do longa está longe de ser essa. O filme conta a história de
quatro garotos – Jorge, Brau, Roque e Zequiel – que vivem em uma favela em Belo Horizonte e
querem criar uma rádio – Rádio Favela – para representar a voz da comunidade em
que eles vivem. Quando conseguem realizar esse sonho, principalmente quando o
sucesso da rádio repercute fora da favela, eles começam a encontrar obstáculos,
como a repressão policial.
Uma das cenas que me chamou atenção, e também vale para
levantar um debate histórico interessante, foi o episódio em que a turma do
colégio de Jorge está discutindo sobre a Lei Áurea. Ironicamente, o que os
alunos comentam é uma história conservadora, afirmando que a abolição foi justa
e que não houve injustiças em relação a outros países, já que o processo foi
pacífico. Jorge, um negro, com uma experiência de vida maior em relação a esta
questão, discorda do argumento do colega, um garoto branco de classe média.
Após uma grande briga, entra o inspetor na sala – também
negro – e pede para o Jorge parar de fazer bagunça, caso contrário, iria
expulsá-lo. É interessante perceber algumas discussões que podem ser levantadas
nessa cena. Como foi mostrado, o racismo ainda existe no Brasil, mas ele é
vedado por um discurso de uma História conservadora que coloca a Princesa
Isabel como heroína nacional. Além disso, o preconceito com Jorge por ser
morador de uma favela é presente, já que este conseguiu uma bolsa de estudos em
uma escola particular pelo fato da mãe ser a faxineira da instituição.
Outro ponto que levanta uma boa discussão é questão da
opressão imposta durante a ditadura militar. Quando as ideias da rádio começam
a circular fora da Favela a policia tenta, de todas as formas, censurar a
rádio. Durante o filme, a rádio é perseguida constantemente pelas autoridades,
pois as questões levantadas atingem o governo e o abuso das autoridades.
Acredito que esse elemento pode ser um bom ponto para instigar curiosos a
pesquisar assuntos que envolvem o período militar. O filme é muito interessante
para debater sobre racismo, abolição, assuntos que envolvem diretamente essas
questões, como as cotas, além de mostrar um período onde a crítica ao governo e
os seus defeitos eram completamente vedados, de qualquer forma.
Esses são os pontos que eu ressaltei, mas, com certeza, o
filme é muito rico para levantar outros assuntos. O evento também contribui
para isso, já que após a apresentação dos filmes – vale ressaltar que, antes do
filme Uma Onda no Ar, foi exibido um curta intitulado No Rastro da Carne (2007) - sempre tem um debate com alguns palestrantes e com a comunidade que assistiu
ao filme no local. Para quem gosta de discutir cinema, acho que vale a pena
participar do projeto. E para quem perdeu esse, pode vê-lo no youtube.
Um comentário:
Bah, vi esse filme no Festival FAM, anos atrás... É muito bom... E vale ressaltar que perdeu da Ancine a indicação para ser o representante do Oscar, e no lugar devido ao lob e ao pai do diretor fazer parte da mesa de decisão, representou-os lá o filme Central do Brasil.
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