domingo, 2 de dezembro de 2012

Sobrevivência apocalíptica

Início de dezembro e as aflições para comemorar as festas de fim de ano já começaram. Recebi um e-mail para confirmar minha presença em um evento marcado para o dia 21, na bela casa de um grande amigo em São Paulo. A data se confirma neste dia justamente para coincidir com o fim do calendário maia, pois caso o mundo acabe, já estaremos com o nosso presente natalino garantido. Um dos participantes sugeriu que os presentes do “amigo secreto” deveriam seguir conforme a situação; isto é, acessórios de sobrevivência apocalíptica. Máscara de gás, botas impermeáveis, comida enlatada, todo o tipo de item necessário para sobreviver sob um céu sangrento, vinda de tsunamis e grandes tempestades.

Gostei da ideia, apesar de saber que com coisa séria não se brinca. Confirmei minha presença e confesso minha ansiedade em rever antigos e bons amigos.

Nessa esfera apocalíptica de festas e lamentos - em escala muito maior -, alguns grupos já se refugiaram em montanhas e lugares afastados da civilização; conforme rege a crença, as grandes cidades serão as primeiras atingidas pela fúria. No Brasil, na Chapada dos Veadeiros, há uma comunidade isolada seguindo as ordens de um guru. O lugar escolhido, acreditam os membros, está a salvo das desgraças advindas do fim do mundo. Penso o contrário: será o local da queda do primeiro meteoro.

A própria NASA, oráculo da ciência, devido a inúmeros emails recebidos, divulgou um comunicado negando qualquer probabilidade científica de apocalipse. Há rumores de jovens pretendentes ao suicídio devido ao bombardeamento de notícias sobre o caso. Uma família teria sugerido matar o próprio filho para poupá-lo das catástrofes vindouras. Tudo isso determinado por um ciclo que se acabaria, o famoso-aclamado-reverenciado calendário maia. Outro remorso é devido a documentos da antiga civilização Suméria, que povoou a Mesopotâmia, preverem um choque de um exoplaneta com a terra. Imensas esferas numa espécie de bilhar planetário, muito bem retratada pelo diretor Lars Von Trier no filme “Melancolia”. Para desmistificar, a NASA sugeriu que o Calendário Maia não é mais do que um calendário de cozinha: ao acabar, basta pendurar outro na parede.

Nesta seara, percebemos a incrível vocação humana para se render ao misticismo e esoterismo. Os líderes religiosos sabem muito bem trabalhar com esse elemento. Podemos entender melhor essas manifestações nos cultos evangélicos de expulsão do demônio – o famoso “sai, capeta”. Ou na insaciável curiosidade dos freqüentadores de cartomantes que prevêem o futuro. Marcio Tomas Bastos sabe bem o que é isso, o ex-ministro da Justiça cobrou 4 milhões de reais para defender uma mulher que assassinou o marido seguindo orientações astrológicas de uma cartomante.

No âmbito internacional, os americanos já haviam criado o pensamento do Destino Manifesto como propósito para assassinar milhares de índios nativos no século XIX. Na década de 70, a seita do reverendo Jim Jones fez sucesso. O líder espiritual fundador da seita “Templo do Povo”, induziu 918 pessoas a se suicidarem por envenenamento na comunidade isolada de Jonestown. Há também a turma do Charles Manson, psicopata que ordenava seus discípulos cometer brutais assassinatos – a atriz Sharon Tate, uma das vítimas, levou 16 facadas na barriga em que carregava um filho de oito meses. Manson mandou seus seguidores, quando capturados e presos, a participarem do julgamento engatinhando no chão como bebês, tamanho domínio mental que ele exercia sobre seus seguidores nefastos.

Espero que os membros dessas comunidades isoladas não sigam ordens parecidas como as de Jim Jones e Charles Manson no momento que se decepcionarem e tiverem que voltar ao trabalho para sobreviver.

Portanto, prefiro a fala de Jesus Cristo registrada no evangelho de Marcos quando indagado sobre o fim dos tempos: “Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai”.

Vou a São Paulo garantir meu acessório de sobrevivência apocalíptica, ciente de que nada adianta fugir para as montanhas, se suicidar, ler livros e assistir documentários no History e Discovery sobre o assunto – aliás, estão fazendo montanhas de dinheiro com essas produções. O mundo vai continuar a girar. É necessário compreender: há muito mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia (teologia), e, melhor ainda, como disse o sábio Rei Salomão, “não há nada de novo debaixo do sol”.
Ricardo Toledo

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