domingo, 12 de agosto de 2012

Papai Noel disfarçado

Meu pai contou que o bom velhinho não existe. Coisa mais bonita acreditar, mesmo que por brincadeira.

Quando eu era pequena, lá pelos três ou quatro anos de vida, meu pai me contou um segredo que mudaria toda a minha infância: Papai Noel não existe. Eu não sei porque diabos ele contou isso a uma criança, ainda mais para a sua própria filha. Talvez na cabeça dele, essas fantasias primárias, delírios infantis, não sirvam para nada. Imagino ele pensando que toda essa “farsa” criada pelos irmãos Grimm, Hans Christian Andersen e talvez pela Coca-Cola (há especulações que afirmam que Papai Noel é invenção da coca) e Disney (Dreams Come True, guys!) só servem para ludibriar a cabeça dos pequenos. Não sei se fiquei triste, feliz, confusa, injustiçada. Eu realmente não lembro das minhas emoções. Tiraram a minha inocência muito cedo, mas não liguei.

Todas as confabulações sobre duendes, fadas, princesas, ogros e bruxas narigudas eu sabia desde sempre, lá no fundinho, que não eram reais. Não importa. Brincava, imaginava, criava e recriava os meus mundos a minha própria maneira. Da mesma forma, que não era crível aquele amontoado de magia, animais falantes e castelos encantados, eu sabia que era. Não acreditava, acreditando. Daquele tipo de fé cega e inabalável que alguns encontram em algum deus, santo ou religião. Falando nisso, quando cheguei na adolescência meu pai virou ateu. Ao contrário de mim ele sempre acreditou, não acreditando, e quando enfim chegou a vida madura resolveu se rebelar. Papai Noel e Jesus Cristo estavam no mesmo patamar, farinha do mesmo saco: fantasia, imaginação. Disso meu pai não precisava me convencer. Tinha as minhas crenças e convicções que nada existe além do céu e abaixo da terra – exceto em momentos de apavoro, quando a gente evoca a todas as divindades e espíritos implorando PELO-AMOR-DE-DEUS para algum milagre acontecer.

Meu pai não é afeito a crenças de nenhuma espécie. Somente com o respaldo científico; atestado, comprovado e assinado pela toda poderosa ciência é que algo pode ser real. Falei que ia a um tarólogo famoso da cidade e ele ficou maluco. Eu comentei que a minha mãe tinha problemas no estômago por culpa do signo de câncer e fui ameaçada a trocar de lar. Eu sei, é uma contradição das brabas: negar a Deus e evocar o zodíaco. Mas a vida é feita de contradições. Apesar do ceticismo ferrenho ele é um cara legal. Pratica yoga, meditação, virou vegetariano por alguns meses, por livre e espontânea vontade, é fã de Star Wars e Indiana Jones, aprendeu malabarismo com um amigo chileno que pratica a sua arte na esquina, vai de bicicleta para o trabalho, surfa e agora quer correr a maratona.

Meu irmão vai completar doze anos, e dia desses comentou: “Ah, eu sei que Papai-Noel não existe, mas e daí? É legal acreditar.” Garoto com personalidade. A imaginação e a criatividade dentro de casa oxalá não vão morrer! Meu pai me ensinou que o bom velhinho não existe, mas com ele também aprendi valores que transcendem as religiões, aos contos infantis e as estórias floreadas criadas para as crianças. Aprendi o que é bom-caráter e lealdade. O significado de amor descobri desde a tenra idade. Tenho as minhas dúvidas de que meu pai, na verdade, é o Papai Noel disfarçado e não quer revelar, vai saber, nunca é tarde para acreditar... mesmo que por brincadeira.

Aline Takaschima

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