Meu pai contou que o bom velhinho não existe. Coisa mais bonita acreditar, mesmo que por brincadeira.

Todas as confabulações sobre duendes, fadas, princesas, ogros e bruxas narigudas eu sabia desde sempre, lá no fundinho, que não eram reais. Não importa. Brincava, imaginava, criava e recriava os meus mundos a minha própria maneira. Da mesma forma, que não era crível aquele amontoado de magia, animais falantes e castelos encantados, eu sabia que era. Não acreditava, acreditando. Daquele tipo de fé cega e inabalável que alguns encontram em algum deus, santo ou religião. Falando nisso, quando cheguei na adolescência meu pai virou ateu. Ao contrário de mim ele sempre acreditou, não acreditando, e quando enfim chegou a vida madura resolveu se rebelar. Papai Noel e Jesus Cristo estavam no mesmo patamar, farinha do mesmo saco: fantasia, imaginação. Disso meu pai não precisava me convencer. Tinha as minhas crenças e convicções que nada existe além do céu e abaixo da terra – exceto em momentos de apavoro, quando a gente evoca a todas as divindades e espíritos implorando PELO-AMOR-DE-DEUS para algum milagre acontecer.
Meu pai não é afeito a crenças de nenhuma espécie. Somente com o respaldo científico; atestado, comprovado e assinado pela toda poderosa ciência é que algo pode ser real. Falei que ia a um tarólogo famoso da cidade e ele ficou maluco. Eu comentei que a minha mãe tinha problemas no estômago por culpa do signo de câncer e fui ameaçada a trocar de lar. Eu sei, é uma contradição das brabas: negar a Deus e evocar o zodíaco. Mas a vida é feita de contradições. Apesar do ceticismo ferrenho ele é um cara legal. Pratica yoga, meditação, virou vegetariano por alguns meses, por livre e espontânea vontade, é fã de Star Wars e Indiana Jones, aprendeu malabarismo com um amigo chileno que pratica a sua arte na esquina, vai de bicicleta para o trabalho, surfa e agora quer correr a maratona.
Meu irmão vai completar doze anos, e dia desses comentou: “Ah, eu sei que Papai-Noel não existe, mas e daí? É legal acreditar.” Garoto com personalidade. A imaginação e a criatividade dentro de casa oxalá não vão morrer! Meu pai me ensinou que o bom velhinho não existe, mas com ele também aprendi valores que transcendem as religiões, aos contos infantis e as estórias floreadas criadas para as crianças. Aprendi o que é bom-caráter e lealdade. O significado de amor descobri desde a tenra idade. Tenho as minhas dúvidas de que meu pai, na verdade, é o Papai Noel disfarçado e não quer revelar, vai saber, nunca é tarde para acreditar... mesmo que por brincadeira.
Aline Takaschima
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