quinta-feira, 14 de junho de 2012

Vida de Coxia

RRrresspeitavel público. Não venho hoje, neste palco solitário, para cantar fados das terras que deixei, nem farei perigosos malabarismos de preposições; esqueçam das ilusões poéticas e dos sarcasmos maquiados de cores febris, apresento-lhes o monólogo do desterro.

Deixo o palco das críticas e os ballets das lívidas argumentações, serei somente eu, neste tablado a meia-luz. Não usarei roupas bufantes, nem mascaras cómicas ou dramáticas, não apelarei ao riso ou ao choro, apresentarei o ser cru, parcial, futil, sentimental, como deve ser.

Não digo que seu tempo será recompensado nesta burlesca apresentação, a menos que esteja aqui para desgustar rançosas pipocas de um velho pipoqueiro. Descarno o brilho do entretenimento, preferindo, agora, o limbo das coxias, tudo por não ter um show preparado para este circo que não aceita repetições.

Minha manifestação, hoje não tem propósito, mas apareço por fazer parte deste triste elenco de artistas e aberrações. Adentro a tenda e atravesso a cortina sem temores pela reação do público, afinal minha proposta é vã.

Dispenso elefantes, mágicos e palhaços chorões. Renego holofones e brilhosas distrações. Convido-os a não fantasiar, a não dispersar, a não camuflar. Vamos! Deliciem-se com os trapézios vazios, sem som de tambores ou menestréis emplumados, soprando agudos trompetes. Vejam os mastros, as cordas e os sacos, que camuflan-se no glamour de desgastadas cortinas de veludo. Observem, simplesmente observem, como pode ser belo o picadeiro sem suas atrações.

De meu monólogo, nem tenho mais o que lhes dizer, acabo mergulhando assim em minhas divagações sem porquês, apreciando a tenda desnuda, viajando pelos olhos das arquibancadas, degustando a mudeza de meu ser.


Ensaio Fotográfico: Le Turk
Gessony Pawlick Jr

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