sexta-feira, 8 de junho de 2012

O Hippie da rodoviária

Hoje é o grande dia, o meu primeiro texto no Estopim saindo do forno. É uma missão desafiadora substituir o Gessony, mas pretendo dar o meu melhor e eu espero estar à altura. Para início de conversa, vou começar contando uma história que aconteceu há alguns anos 

Eu passava de vez em quando pela rodoviária Rita Maria, despreocupado e morrendo de vontade de ir para a minha casa. Lá, eu era constantemente abordado por vários pedintes. Mas um em particular me chamou a atenção, um jovem de vinte e poucos anos, com roupas rasgadas e velhas, jeans sujos de terra, sandálias gastas, dread locks pretos, barba irregular e serrada, olhos claros bem abertos e um sorriso tímido. Na primeira vez que eu passei por ele, admito que estava com pressa e não dei muita atenção. Na segunda vez, ele me perguntou se eu queria algum dos artefatos hippies que ele estava vendendo ou se eu poderia ajudar com trocados, dei umas moedinhas e ele agradeceu baixando a cabeça em tom de reverência. 

Na terceira vez, não resisti e dei uma boa olhada nos seus produtos artesanais, que estavam estendidos em uma tela grande. Havia de tudo: pulseiras de todas as cores, colares feitos com pedras e tecidos, anéis, brincos e outras lembrancinhas. Comprei uma pulseira para ajudá-lo, ele novamente me agradeceu com o gesto de baixar a cabeça. 

Em uma bela manhã de sábado, eu voltava da faculdade bem humorado, como há tempos não acontecia. Novamente vi o rapaz abordando as pessoas que passavam por ali. Ele já me conhecia de vista e me chamou com uma voz rouca e baixa: “ô meu amigo cabeludo, queres alguma coisa hoje? podes me dar uma ajudinha?” Eu deixei umas moedas novamente e ele fez o mesmo gesto de sempre. Dessa vez, deixei a timidez de lado, sentei com ele em cima de um tapete no chão de cimento, debaixo do sol quente. Perguntei o porquê de ele ter escolhido essa vida de artesão e de vendedor de rua. Ele me disse com um sorriso no rosto: “o que mais eu poderia ser? Essa é a minha vida, eu que fiz a minha escolha”. Perguntei há quanto tempo ele trabalhava ali e quais eram os seus horários, ele respondeu que há dois anos fazia isso, trabalhando desde as sete da manhã até às seis horas da tarde. O que parecia ser uma conversa despretensiosa acabou sendo reveladora quando ele contou sua vida. 
  
“Sabe, eu morava com uma família de classe média-alta. Meus pais queriam que eu fosse médico lá no Paraná, mas eu disse que não, que não era a vida pra mim. Eu só queria viver de arte, em paz e harmonia com a natureza e com os seres humanos. Eles me expulsaram de casa e com o dinheiro que eu peguei lá, comecei a planejar meu caminho. Vim pra cá, fiz amizades e aprendi a fazer artesanatos. Hoje, moro com mais cinco amigos nessa mesma vida que eu, tenho uma mulher, produzo arte, o que mais eu poderia querer? Sou muito feliz assim!” 

Isso me fez pensar, vale mais a pena ser bem sucedido em uma profissão e ser infeliz, ou fazer algo que se gosta, independente da renda? Eu me despedi dele e fui para casa. 
  
Eu passava por lá e sempre encontrava o “amigo”. Hoje em dia, ele não está mais no lugar de sempre. Nunca mais o vi e nunca descobri o seu nome, mas até hoje, nunca me esqueço daquele rapaz simples e alegre e da reflexão que ele me trouxe. 

"Quem faz o que gosta nunca vai trabalhar na vida
(Provérbio Italiano)

Felipe Kowalski

Um comentário:

Patricia disse...

Q lindo, Mr. K!!! Inspiradora mesmo a história desse rapaz...